quinta-feira, 8 de março de 2012

SOCIOLOF-A-N-D-O

Basta amedrontá-los?
O jovem pode no conjunto das suas relações não ter muitos adultos significativos, mas se existir pelo menos um com quem possa ser estabelecida uma relação de vinculação segura, a probabilidade deste enveredar por um caminho desviante será efetivamente menor.

"Em 1977 foi feita uma tentativa dramática para tratar a delinquência. Alguns adolescentes (rapazes e raparigas) fizeram parte de um estudo especial. Tendo sido classificados como delinquentes, foram aleatoriamente destinados a um grupo de tratamento (experimental) e a um grupo de controlo. Os delinquentes do grupo de tratamento foram levados a uma prisão para adultos em Rahway, Nova Jérsia; ali, indivíduos adultos do núcleo duro, condenados perpetuamente a trabalhos forçados, confrontaram-nos verbalmente com o erro que cometeram nas suas vidas. Os adultos criminosos vociferaram, inquietaram e assustaram os delinquentes. Relataram a verdade nua e crua da vida na prisão, tal como a brutalidade, as violações homossexuais, a degradação e a falta de liberdade pessoal."
Finkenauer, J. O., e Kuhmerker, L., Scared straight. Moral Educational Forum, 1979, 4 (3), 1-7).

Quais lhe parece terem sido os resultados deste estudo? Se está a imaginar que os adolescentes do grupo experimental enveredaram por caminhos com menos encruzilhadas, posso desde já dizer-lhe que se enganou. Na verdade, a ida à prisão e o "tratamento de choque" verbal que se seguiu foi comprovadamente pior do que se não tivesse havido qualquer tratamento. Os elementos do grupo de controlo foram detidos em número muito mais reduzido do que os elementos do grupo experimental.
Num outro estudo realizado em 1984, com 260 delinquentes jovens, em vez de se procurar amedrontar os adolescentes foi usada como estratégia a supervisão, tendo esta produzido efeitos bastante diferentes da estratégia anterior. Ou seja "os jovens eram menos propensos a cometer novos atos antissociais se fossem colocados sob a supervisão de um adulto sensível e interessado, tal como um técnico que trabalhe com esta faixa etária ou um conselheiro que disponha de tempo para ouvir e responder aos adolescentes e que se interesse verdadeiramente pelo que lhe acontece". Os resultados deste último estudo vêm reforçar uma ideia que já muitas vezes tem sido referida em artigos anteriores: a importância da existência de uma relação afetiva securizante no bom desenvolvimento humano. O jovem pode no conjunto das suas relações não ter muitos adultos significativos, mas se existir pelo menos um com quem possa ser estabelecida uma relação de vinculação segura, a probabilidade deste enveredar por um caminho desviante será efetivamente menor.
Os resultados destes estudos trouxeram-me à memória o caso de uma adolescente que acompanhei há já alguns anos. A adolescente vivia com a avó e o pai, uma vez que a mãe tinha problemas de alcoolismo. O pai era verdadeiramente excecional. Ainda hoje, embora não me lembre do seu rosto, recordo a sua sensatez e coerência. A adolescente namorava com um rapaz toxicodependente. Apesar desta relação não ser vista com bons olhos pelo pai, este nunca proibiu o namoro, embora tentasse demovê-la desta relação, usando uma estratégia bastante curiosa: levava-a ao local onde o namorado consumia drogas para que pudesse ver com os seus próprios olhos que ele era consumidor, já que ele lhe garantia que não o era. Como "água mole em pedra dura, tanto dá até que fura", este pai, com a sua estratégia, acabou por conseguir mostrar à filha que aquela relação iria trazer-lhe muitos problemas. Apesar de ter sofrido bastante, a adolescente acabou por terminar a relação.
Este caso, bem como os estudos anteriores, mostra claramente que as mudanças só se podem operar, verdadeiramente, no contexto de relações marcadas pela afetividade, não sendo o amedrontar ou o proibir a chave da mudança.

Bibliografia: Psicologia do adolescente. Uma abordagem desenvolvimentista. Norman A. Sprinthall e W. Andrew Collins. Fundação Calouste Gulbenkian.
(http://www.infopedia.pt/$basta-amedronta-los)

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