Pré-História Brasileira: Um Ensaio.
Elton Luiz Valente
O gênero humano evoluiu em ambiente de vegetação do tipo savana, de fitofisionomia aberta. Em condições naturais, a floresta não é um ambiente confortável para a nossa espécie. Em sua diáspora pelo mundo, o Homo sapiens provavelmente colonizou mais facilmente aquelas áreas onde o ambiente era semelhante ao de sua origem atávica. Na América do Sul, mais especificamente na área que corresponde ao Brasil, durante e após a última glaciação (cerca de 10.000 anos atrás), parece natural que o homem tenha desenvolvido suas comunidades em áreas como as Coxilhas Gaúchas, a Caatinga e o Cerrado, ambientes de vegetação aberta. Nestas áreas encontram-se muitos dos sítios arqueológicos já descobertos no território brasileiro.
É bem possível que a principal rota de dispersão do homem pela América do Sul tenha se dado por vias litorâneas, que certamente apresentavam clima mais agradável, facilidade de locomoção e maior disponibilidade de alimentos independentemente das estações. Em períodos frios do Pleistoceno (de 1,6 milhão a 10.000 anos atrás), o nível global dos oceanos sofreu recuos em até mais de 100 metros, portanto, os possíveis sítios arqueológicos litorâneos, da transição entre o Pleistoceno e o Holoceno (iniciado no fim da última Era Glacial, há cerca de 10.000 anos), estão agora submersos. Mesmo aqueles sítios do interior do continente, datados desse mesmo período, certamente localizados em áreas como leitos maiores dos rios e terraços, ou terrenos marginais de lagos, muito provavelmente foram destruídos pelos processos erosivos intensos do Quaternário (que compreende todo o Pleistoceno e o Holoceno).
Por outro lado, ainda no fim da última Era Glacial, há cerca de 10.000 anos atrás, as florestas tropicais das Américas estavam restritas a refúgios de matas e brejos de encostas e serras úmidas. A América do Sul era tomada por eixos de expansão de semi-aridez e Cerrados, segundo o geógrafo brasileiro Aziz Nacib Ab'Saber, em trabalho publicado em 1977. É de se esperar que os períodos secos do Pleistoceno tenham influenciado a ecologia do homem americano. Uma importante fase climático-ecológica Pleistocênica teria ocorrido entre 20 mil e 12 mil anos atrás. Sem dúvida, o homem já estava instalado na porção leste da plataforma continental sul-americana há cerca de 11 mil anos atrás. Vários sítios arqueológicos datados desse período são encontrados em diversas regiões brasileiras. Muito provavelmente a dispersão das populações paleoindígenas daquele período, por toda a América do Sul e principalmente na vasta região que viria a ser o território brasileiro, foi favorecida, de certa forma, pelas condições climáticas e fitogeográficas vigentes. Desde a Região Amazônica até o Brasil Central, bem como do Nordeste até a Região Sul, dominavam vegetações de natureza e fitofisionomias savânicas.
De modo análogo, segundo Ab'Saber (1986), a presença de enclaves de vegetações savanizadas nos domínios da Floresta Amazônica, em tempos atuais, são testemunhos dessa vegetação pretérita, arcaica, de clima mais frio e seco, antecessora da recente expansão, em clima mais quente e úmido, das coberturas florestais amazônicas. Fenômeno este que teria ocorrido significativamente após a mudança do Pleistoceno para o Holoceno, coincidindo com o final da última glaciação e se estendendo até hoje.
O ambiente não deve ser encarado como um contexto generalizado para a ação humana ou como uma força determinista; ao contrário, deve ser entendido como conjuntos de limitações e de oportunidades às quais as populações humanas podem ou não responder (Neves, 1991; Moran, 1991). O fato é que existem importantes registros arqueológicos em todas as regiões brasileiras, revelando indícios significativos da ocupação humana do período pré-histórico ao pré-colombiano, em vários pontos do território nacional.
CONHEÇA MAIS:
1) Arqueologia Brasileira. André Prous. Brasília: UnB, 1992. 613p.: il.
2) No Rastro do Povo de Luzia. Entrevista com Walter A. Neves. Le Mond Diplomatique Brasil. Ano 1, número 10, maio de 2008, p.12-14.
3) Arquivos do Museu de História Natural. André Prous & Loredana Ribeiro (Org.). Belo Horizonte: UFMG, vol. XVII/XVIII,1996/7. 523p.: il.
4) Origens, Adaptações e Diversidade Biológica do Homem Nativo da Amazônia. Walter A. Neves. Belém: Museu Parense Emílio Goeldi, 1991. 192p.: il.
5) Espaços Ocupados Pela Expansão dos Climas Secos na América do Sul, Por Ocasião dos Períodos Glaciais Quaternários. Aziz Nacib Ab'Sáber. Paleoclimas, São Paulo: USP, v.3, p.1-19, 1977.
6) Geomorfologia da Região de Carajás. Aziz Nacib Ab'Sáber. In: Almeida. J. M. G. de (Org.). Carajás: Desafio político, ecologia e desenvolvimento. Cap. 5: Brasiliense. 1986, p.88-124.
7) Key Environments: Amazônia. Prance, G. T. & Lovejoy, T. E. (eds). Oxford: Pergamon Press. 1985. 442p.: il.
(http://scienceblogs.com.br/geofagos/2008/06/pre-historia-brasileira-um-ensaio.php)
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