domingo, 27 de fevereiro de 2011

VIAJANDO NO TEMPO

1844 – Os farrapos Onofre Pires e Bento Gonçalves duelam por questões de honra. O duelo termina com um ferimento de Onofre.

“Que los hermanos sean unidos,
Porque esa es la ley primera,
Tengan unión verdadera
En cualquier tiempo que sea –
Porque si entre ellos pelean,
Los devoran los de ajuera”
(Martin Fierro, de José Hernandez).

Bento Gonçalves da Silva, o grande Comandante da Revolução Farroupilha, era primo-irmão de Onofre Pires.
Mais do que primos, eram amigos, há mais de 30 anos.
E irmãos de armas.
Mas, registra a História, Onofre Pires “era murmurador e costumava falar mal dos outros pelas costas”.
Tinha inúmeras qualidades, mas esse péssimo defeito.
E por ter esse defeito, como é próprio de quem murmura e fala pela costas, ouvia diz-que-diz-que.
E acreditava em boatos e murmúrios mal-intencionados.
Isso provocou a desunião no sonho farroupilha.
A ponto de, no Cerro Topador, nas proximidades do arroio Sarandi – hoje município de Sant’Ana do Livramento -, em fevereiro de 1844, o Exército Farroupilha dividir-se em dois acampamentos.
Um era o acampamento de Bento Gonçalves.
O outro, o de David Canabarro (a quem Bento passara a Chefia do Exército), no qual se encontrava o grupo que se opunha ao grande General Farroupilha: Vicente da Fontoura, Lucas de Oliveira e Onofre Pires.
Quando a desunião se instala entre irmãos, começa a ruir o sonho.
Porque o ideal precisa que os irmãos sejam unidos.
Quando, porém, a intriga prevalece, se desvanece o sonho.
Ruem os ideais.
Fenece a luta.
Mas… a História ensina que alguém sempre é usado, ainda que inconscientemente, como instrumento.
Foi o que, mais uma vez, ocorreu.
Vicente da Fontoura e Lucas de Oliveira não tinham a mínima condição de duelar com Bento Gonçalves.
Não eram homens da mesma estirpe.
Longe disso.
Insuflaram, então, com argúcia e artimanhas, o Coronel Onofre Pires a difamar a honra e a reputação do grande General Farrapo.
Era demás pra têmpera do gaudério Bento Gonçalves.
Escreve, então, uma carta a Onofre, exigindo que ele confirme, ou não, por escrito, as acusações.
O Coronel responde ao General, confirmando, por escrito e claramente, sem qualquer evasiva, esquiva ou malícia, tudo o que afirmara.
Diante da resposta, Bento desafia Onofre Pires para um duelo, à espada.
O desafio para o duelo é aceito de imediato e realizado na mesma data, no clarear do dia 27 de fevereiro de 1844.
Ao amanhecer, Bento monta no seu picaço e vai até a tenda de Onofre.
Grita: Onofre!
O Coronel logo aparece, com a cara de quem está acordando, e ouve a pergunta:
- Sabe por que eu vim?
- Vou encilhar o colorado – foi a resposta.
É da tradição do duelo.
As ofensas já foram ditas.
Mais importante: é a estirpe farrapa - respeito aos homens de honra.
Pouco tempo despôs, aparece Onofre, de cara lavada e montado no seu cavalo de confiança.
Afastam-se, lado a lado, no picaço e no colorado, em trote sem pressa, até um capão de mato, há cerca de 14 de légua.
Desmontam, desembainham as espadas.
Miram-se.
A vantagem, na ótica de Lucas de Oliveira e de Vicente da Fontoura, é toda de Onofre Pires, 11 anos más moço.
Além disso, embora Bento Gonçalves continuasse forte, aos 55 anos, e fosse um homem de bom porte, Onofre Pires era imenso: cerca de dois metros de altura e muito corpulento.
Mas esqueceram de uma côsa: era Bento Gonçalves.
O duelo é travado.
Brilham as espadas, faiscando no dia que amanhece.
Tinidos de aço espantam as aves, solitárias testemunhas do triste duelo.
Bento Gonçalves termina a luta de pé, com a ponta da espada ensangüentada pelo ferimento causado no antebraço direito de Onofre Pires, que deixa cair a sua arma.
Bento se aproxima e, com o seu próprio lenço, tenta estancar a hemorragia.
Busca socorro para o primo e irmão de armas.
É inútil.
Onofre Pires é atingido pela gangrena e morre, poucos dias depois.
Começa a morrer o sonho da República Rio-Grandense.
(Newton Fabrício)
Obs: o diálogo acima, entre Bento e Onofre, constitui trecho transcrito do livro “Os Varões Assinalados”, de Tabajara Ruas.
As três linhas seguintes ao diálogo correspondem a trecho extraído – mas modificado – da obra “A Guerra dos Farrapos”, de Alcy Cheuiche.
Obs 2: esse conto constará do livro “Causos, fandangos e domas de potros", a ser publicado.

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