“A função do historiador é lembrar a sociedade daquilo que ela quer esquecer.” (Peter Burke)
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011
VIAJANDO NO TEMPO
1939 – Osvaldo Aranha, chanceler do Brasil, desembarca em Nova York, nos EUA, para uma entrevista com o presidente americano Franklin Delano Roosevelt.
O Chanceler do Estado Novo
A implementação do Estado Novo provocou grande aflição em Washington e os comentários da imprensa e do governo estadunidense eram de temor quanto à natureza do novo regime brasileiro. Nesse sentido, uma das primeiras tarefas de Oswaldo Aranha no ministério das Relações Exteriores foi acabar de vez com qualquer suspeita de influência européia no Estado Novo. O jornal The New York Times , anunciando que Aranha assumira a pasta do Exterior do governo Vargas, declarou que o novo chanceler "é um democrata tão firme que seu ingresso no governo do presidente Getúlio Vargas é considerado a garantia de que o regime não esteja modelado nas ditaduras fascistas européias" (apud HILTON, 1994, p. 270). O próprio Cordell Hull, secretário de Estado dos EUA, exaltou a indicação de Aranha para o cargo, afirmando que ele no Itamaraty poderia fazer ainda mais pela aproximação entre Brasil e EUA do que na embaixada em Washington.
Aranha tomou posse em março de 1938, com uma enorme base política no Brasil, e, devido à característica germanófila do gabinete de Vargas, era a última esperança dos brasileiros que ainda eram favoráveis a um regime democrático. A posse de Aranha toma proporções ainda maiores, quando se tem em mente que Vargas não tinha dúvidas que Aranha assumiria o ministério mais importante de seu governo. O fato, além de representar uma vitória pessoal de Aranha, era valioso também para Vargas, pois, assim, eliminava uma possível oposição interna, garantia o fim das apreensões estadunidenses quanto ao Estado Novo e reequilibrava a equipe ministerial.
Segundo Seitenfus (2003), a política externa nacional sob o comando de Aranha seria caracterizada pela aversão à Itália e à Alemanha e pela aproximação cada vez maior com os EUA. Já Gerson Moura (1980) afirma que a política externa do Estado Novo obedeceu à lógica da eqüidistância pragmática entre os EUA e a Alemanha, orbitando sobre as influências dos dois países para angariar o maior número de vantagens possível, graças à constante ambigüidade de Vargas e a composição de seu gabinete. As diferentes impressões se justificam pela ambigüidade da política externa do período. Se por um lado, Aranha tinha uma posição convicta quanto ao posicionamento do Brasil, do outro, Vargas sempre transitava dos dois lados, praticando uma política externa paralela. Em um ambiente majoritariamente germanófilo, era a influência de Aranha que assegurava o pan-americanismo na política externa pendular do Estado Novo.
O presidente, sempre atuando como árbitro final nas decisões, ganhou poderes extraordinários no processo decisório. Apesar de Aranha estar a cargo da política externa do País, as decisões sempre eram afetadas pelos diferentes interesses representados no gabinete de Vargas. E o presidente não hesitava em adaptar sua decisão de acordo com seus interesses, ora fortalecendo a ala pan-americana do governo, ora fortalecendo os germanófilos. Dessa forma, as decisões em política externa refletiam as divergências da equipe ministerial do Estado Novo e a política pendular de Vargas prevaleceu, o que fortaleceu a influência de Aranha no processo.
Em 1938, o comércio bilateral Brasil-Alemanha continuava a crescer, chegando o país europeu, inclusive, a ultrapassar os EUA como maior destino das exportações nacionais. No entanto, algumas decisões do Estado Novo estremeceram a relação harmoniosa entre Brasil e Alemanha. O governo de Vargas começou a intensificar a campanha de nacionalização, temendo a formação de uma minoria germânica[19]principalmente no sul do País. Uma das medidas foi, no mesmo momento em que foi proibida a formação de partidos, vedar aos estrangeiros o exercício de atividades políticas. Desde 1934, o partido nazista (NSDAP[20]tinha representação do Brasil, influenciando a grande colônia alemã, instalada, principalmente, no Sul, e em São Paulo e Espírito Santo. Havia, inclusive, uma imprensa pró-nazista, com jornais publicados em alemão, muitos deles subsidiados pela embaixada alemã [21]A campanha de nacionalização, além de proibir a atividade política de estrangeiros, fechou escolas que ministravam suas aulas em língua estrangeira, proibiu a organização de clubes ou sociedades estrangeiras, mesmo que não políticas, e proibiu a circulação de jornais estrangeiros, entre outras restrições. A campanha não tinha um alvo específico, mas, sem dúvida, os alemães foram os mais afetados pela intensa presença nazista no Sul do País (SEITENFUS, 1995).
A diplomacia nazista protestou veementemente contra as ações brasileiras. Karl Ritter, então embaixador alemão no Brasil, foi o principal porta-voz do descontentamento germânico com relação ao fim das atividades do partido nazista no País. O embaixador pedia constantemente audiências com Vargas e com Aranha para discutir a situação, nem sempre em tom diplomático. A explicação de Vargas e Aranha era sempre a mesma: nenhum País tem a obrigação de garantir o funcionamento de um partido político estrangeiro. O governo brasileiro temia que isso se tornasse fonte de perturbações futuras. Porém, Ritter era irredutível e, cada vez mais, sua atitude arrogante irritava Aranha, que viria a declarar o embaixador persona non grata [22]em 1939. Em resposta à atitude de Aranha, o governo nazista fez o mesmo com o embaixador brasileiro em Berlim, Moniz de Aragão. No entanto, apesar da crise diplomática entre Brasil e Alemanha, as relações comerciais não foram afetadas e a participação alemã no comércio nacional continuava a crescer durante o ano de 1938.
A principal preocupação dos EUA era impedir que o Estado Novo ficasse na órbita de influência nazista. A nomeação de Aranha foi o passo quase definitivo para acalmar o governo de Roosevelt. A crise diplomática com a Alemanha serviu também para aproximar ainda mais Brasil e EUA. Importante também foi a proibição do exercício de partidos políticos, que colocou a AIB na ilegalidade, e a campanha de nacionalização, que espantou o fantasma da "minoria" nazista (CERVO; BUENO, 2002).
Também foi criado nos EUA, com o intuito de dissipar a influência germânica no continente, um departamento especial para promover a boa vizinhança na região. Esse departamento não se limitou às ofensivas políticas e econômicas para angariar a simpatia do continente. Várias iniciativas culturais foram promovidas pelo departamento direcionadas especialmente para o Brasil, como a criação do personagem Zé Carioca por Walt Disney e a visita ao País de estrelas de Hollywood (ARGUELHES, 1996).
Na Europa, a situação era cada vez mais preocupante. Em 1938, dois acontecimentos marcaram dramaticamente o destino do continente, preparando o terreno para mais um conflito armado. Em um primeiro momento, as tropas nazistas anexaram o território austríaco sem disparar um tiro sequer, pois o partido nazista já havia feito seu trabalho junto ao governo austríaco. Mais tarde, a Alemanha reivindicou a integração das minorias germânicas que habitavam a região dos Sudetos, na Tchecoslováquia. Para decidir a questão, foi realizada, em setembro, uma conferência internacional em Munique. No conclave, do qual, inexplicavelmente, a Tchecoslováquia, a principal interessada, não participou, franceses e ingleses, obedecendo à lógica da "política do apaziguamento", cederam e concordaram com a anexação dos Sudetos. Assim, os planos de expansão da Alemanha de Hitler seguiam sem percalços (VIGEVANI, 1991).
No calor do momento, a polícia brasileira supostamente encontrou no sul do País o controverso relatório "von Hontz". Segundo o documento, estaria em movimento um plano para numerosas ações subversivas por parte dos alemães que se encontravam no Brasil. O plano obedecia à lógica do anschluss e seria comandado pelo próprio governo alemão. O relatório se provou uma farsa, mas foi utilizado por Aranha para aumentar as preocupações dos EUA com a região. O objetivo do chanceler era reforçar o apelo por um pacto de segurança coletiva no continente, que poderia ser alcançado na Conferência Pan-Americana em dezembro de 1938, em Lima, e insistir na necessidade de rearmamento do Brasil. Os EUA, que já se inquietavam com as manobras alemãs na Europa, temendo que essas ações chegassem à América, levaram o tema da segurança continental para Lima (HILTON, 1994).
Após travar as decisões na Conferência de Consolidação da Paz de Buenos Aires em 1936, a Argentina já se preparava para sabotar a Conferência de Lima. O então chanceler portenho, José Maria Cantilo, chegou a propor, sem sucesso, o adiamento da conferência. O objetivo do Brasil e dos EUA era, principalmente, reafirmar o princípio de solidariedade continental e estabelecer a defesa continental contra ameaças externas. A posição argentina contra o pan-americanismo coercitivo, porém, era irredutível. Segundo Seitenfus (2003), a posição defendida pela Argentina explicava-se, principalmente, por quatro razões: a presença de influente minoria ítalo-alemã no País; a orientação de seu comércio exterior para a Europa; a crença de que os parceiros europeus eram mais seguros, ao contrário dos EUA, cuja política seria constantemente afetada pelos embates eleitorais e por um poderoso Congresso; e a admiração pela organização militar alemã.
A Conferência de Lima se iniciou em 9 de dezembro de 1938. A delegação brasileira foi comandada pelo ex-ministro Afrânio de Melo Franco, pois Aranha preferiu não se afastar do Rio de Janeiro, em razão da delicada situação interna. Os EUA enviaram seu secretário de Estado, Cordell Hull. Enquanto a Argentina enviou apenas um alto funcionário diplomático, mostrando seu desdém pela Conferência. A evidente má vontade argentina fez Hull declarar que, durante a reunião, ele estaria "diante dos dez dias mais difíceis" de sua carreira (apud SEITENFUS, 2003, p. 154).
Como era esperado, a posição argentina impediu a unanimidade das decisões. Era preciso encontrar uma saída para o obstáculo argentino. Aranha, apesar de longe de Lima, além de orientar Melo Franco, trabalhou em conjunto com a embaixada estadunidense durante os preparativos da Conferência. Melo Franco, presidindo a comissão encarregada de analisar as questões relativas à paz continental, indicou o abandono do princípio coercitivo, retirando do texto as palavras tratado ou convenção, transformando as decisões em resoluções, de caráter meramente recomendatório. Apesar da oposição argentina, a declaração de Lima foi considerada muito importante. Entre suas resoluções, destacam-se as que previam que, no caso de intervenção extracontinental ou ameaça a paz na região, os países americanos deveriam concertar-se, e a que previa a convocação, por qualquer país signatário da declaração de Lima, de reuniões extraordinárias dos chanceleres da região sempre que a paz continental fosse ameaçada. Para Camargo, Araújo e Simonsen (1996), a Conferência foi um avanço na busca dos ideais pan-americanos e foi a mais importante reunião desse gênero até então.
O Itamaraty aplaudiu as resoluções da declaração de Lima, porém lamentou o seu caráter não-obrigatório. Aranha provou mais uma vez seu apoio às iniciativas estadunidenses e se mostrou disposto a realmente ser o baluarte do pan-americanismo no Brasil. No entanto, o chanceler do Estado Novo pretendia ir além da cooperação pan-americana e apostava no estabelecimento de uma cooperação em larga escala entre o Brasil e os EUA. Nesse ambiente favorável, Roosevelt convidou Aranha a Washington, para entabularem conversações diretas. Começava a missão Aranha, momento crucial da política externa do Estado Novo (SEITENFUS, 2003).
5.1 A Missão Aranha
O convite para a visita do chanceler brasileiro aos EUA chegou, em 9 de janeiro de 1939, ao presidente Vargas, que prontamente o aceitou e sugeriu que o Departamento de Estado dos EUA elaborasse uma lista dos assuntos a serem tratados. A lista era extensa e as questões eram dividas em dois grupos: as questões políticas, tratadas com o Departamento de Estado, e as econômicas, com o Tesouro. A missão Aranha previa a elaboração de um plano de cooperação referente à defesa nacional do Brasil, discussões quanto ao financiamento de um programa de desenvolvimento econômico no Brasil, discussões quanto ao capital estadunidense investido no Brasil, a negociação da dívida externa brasileira e o problema da suspensão do pagamento dos juros e iniciativas para a criação de um Banco Central no Brasil. Aranha também colocou na pauta outra exigência do Brasil, o reequipamento das Forças Armadas nacionais (CORSI, 2000).
A missão chegou a Washington no início de fevereiro de 1939. A comitiva era formada, além do próprio chanceler, por Luis Simões Lopes e Marcos de Souza Dantas, do Banco do Brasil, e pelos diplomatas João Carlos Muniz e Sérgio Lima e Silva. A missão foi recebida pelo presidente Roosevelt e manteve contato, durante o período em que esteve nos EUA, com empresários, sindicalistas, artistas e religiosos.
O objetivo maior da viagem era o de diminuir a influência alemã e aproximar o Brasil dos ideais pan-americanos preconizados pelos EUA. Sabendo disso, Aranha, em vários encontros, tratou de lembrar aos estadunidenses do sucesso da concorrência comercial alemã no País, e que os nazistas estavam dispostos a oferecer mais (HILTON, 1994). Para o chanceler, a política da boa vizinhança precisava ser mais prática, com o intuito de criar mercados e aliados na América, pois, se os EUA não fizessem, outros Estados estavam dispostos a fazê-lo (MOURA, 1980). Assim, o eixo das negociações tomou uma característica de barganha político-econômica.
A questão da retomada dos pagamentos dos juros da dívida externa brasileira foi a que mais esteve em voga nas negociações com o Tesouro. A posição oficial do governo de Vargas era não firmar nenhum compromisso concreto em relação à dívida, mas Aranha considerava essencial, para a credibilidade do Brasil, que o governo sinalizasse alguma promessa de retomada do pagamento, o que causou algum desconforto entre Aranha e o ministro da Fazenda, Souza Costa (CORSI, 2000). O próprio chanceler explicou sua posição em discurso ao retornar de sua missão aos EUA:
Meu propósito (...) foi tranqüilizar os portadores de nossos títulos, mais de meio milhão de pessoas, cuja atitude durante nossa estada fora a mais simpática possível (...) e porque não pode haver um plano econômico baseado no não pagamento das dívidas (...) Sou pelo pagamento das dívidas públicas, e creio que não há ninguém, além dos comunistas, que seja favorável ao repúdio de suas dívidas. Sempre, porém, subordinei essa obrigação moral de pagar à capacidade material de o fazer (...) Tudo depende, pois, da possibilidade e da capacidade de pagar (...) A possibilidade surge com o reerguimento econômico do País. Não podemos relegar indefinidamente a consideração de um problema básico para o nosso prestígio internacional (ARANHA, 1994, p. 46).
Quanto às questões fundamentais para o governo de Vargas, o desenvolvimento econômico com o lançamento da base industrial e o reequipamento militar, as negociações foram superficiais e esboçadas, sem que nada concreto fosse discutido. Aranha foi um dos maiores partidários do desenvolvimento complementar brasileiro em parceria com os EUA, acreditando ser impossível algo realizado somente com capital nacional. Nesse sentido, o chanceler se esforçou para obter um resultado concreto, mas obteve somente uma promessa de crédito do Export and Import Bank (Eximbank).
Os resultados concretos mais importantes da missão foram os seguintes: a obtenção de um crédito de 19,2 milhões de dólares do Eximbank; a obtenção de um crédito de cinqüenta milhões de dólares do Tesouro estadunidense a fim de constituir um fundo de reserva indispensável à criação do Banco Central; a promessa de um crédito de cinqüenta milhões de dólares do Eximbank para financiar a implantação de uma siderúrgica no Brasil; e a promessa do governo estadunidense de facilitar e incentivar a constituição de empresas conjuntas brasileiro-estadunidenses, com capital dos dois Países, a fim de desenvolver a produção de matérias-primas, bem como a exploração e comercialização da indústria extrativa brasileira (SEITENFUS, 2003).
Não obstante os entraves, segundo Seitenfus (2003, p. 158), "as negociações se desenvolveram num clima de perfeita compreensão" e a facilidade e "rapidez com que acordos substanciais foram assinados fizeram da missão Aranha um empreendimento relativamente bem-sucedido". No entanto, o autor admite que "a missão Aranha representou menos um alinhamento do Rio de Janeiro com a política de Washington, sendo antes uma retomada do diálogo entre os dois Países".
De acordo com Moura (1980), o resultado mais importante da missão foi a promessa de troca de visitas dos chefes militares de ambos os países. Para ele, a missão significou o primeiro momento de ruptura da eqüidistância pragmática em favor dos EUA.
Para Stanley Hilton (1994, p. 308), a importância e o valor da missão
Estava(m) em seus efeitos de longo prazo: representava o início de um processo de consulta bilateral que se intensificaria nos próximos anos até alcançar, durante a guerra, as dimensões de uma verdadeira aliança. Mas, em um sentido imediato, em termos de assistência tangível, os resultados foram modestos quando projetados contra o pano de fundo do otimismo que os contatos iniciais haviam gerado.
A missão Aranha foi bem-sucedida por atender às necessidades de ambos os países. No caso do Brasil, apesar dos parcos resultados, foi importante para reafirmar um pan-americanismo que pudesse trazer benefícios com a cooperação bilateral entre Brasil e EUA. Para Washington, para que finalmente reconhecesse no Brasil um parceiro digno de maior interesse no continente. Porém, foi, principalmente, mais uma vitória de Aranha em seu objetivo de aproximar Brasil e EUA.
Quanto ao caso Ritter, Aranha se esforçou para justificar aos países europeus, principalmente à Itália, sua atitude na questão, argumentando a falta de tato diplomático do embaixador alemão. Para normalizar as relações diplomáticas com a Alemanha, Aranha, ao retornar de sua viagem aos EUA, trocou notas diplomáticas com a Wilhelmstrasse (ministério das relações exteriores alemão) em 1º de junho de 1939, designando os respectivos novos embaixadores. O Brasil passou a ser representado por Cyro de Freitas Vale e a Alemanha por Curt Prüffer (SEITENFUS, 2003). As relações diplomáticas entre Brasil e Alemanha estavam restabelecidas e as relações comerciais continuavam sem percalços.
No entanto, o início do conflito armado na Europa, em setembro de 1939, foi o ponto de inflexão, não só da política externa brasileira, mas das relações internacionais como um todo. O espaço de manobras do Brasil se reduziu drasticamente. A deflagração do conflito europeu, apesar de mais algumas tentativas frustradas, o fim da "opção alemã" (MOURA, 1980). A diplomacia brasileira, que antes era reativa, foi obrigada a agir para conseguir o reequipamento militar do País e o complexo siderúrgico nas melhores condições possíveis.
Do temor de Washington quanto à natureza do Estado Novo à missão Aranha, o governo de Roosevelt conseguiu se aproximar mais do Estado Novo, independentemente das características autoritárias de Getúlio Vargas. O chanceler brasileiro conseguiu, em menos de um ano cargo, dar início à uma cooperação entre o Brasil e os EUA que seria muito importante para o Brasil nos anos seguintes.
5.2 A Neutralidade
O golpe que deu início ao conflito europeu, no primeiro dia de setembro de 1939, foi a invasão da Polônia pelo exército alemão. O país invadido foi dividido entre os alemães e os soviéticos, obedecendo o Pacto de Não Agressão firmado entre a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e a Alemanha, semanas antes. Franceses e ingleses, que haviam cedido aos nazistas na questão dos Sudetos um ano antes, protestaram contra a atitude das forças armadas alemãs e, dois dias depois, após a recusa nazista em retirar suas tropas da Polônia, declaram guerra à Alemanha. (VIGEVANI, 1991).
O governo brasileiro, ao receber a notícia do início das hostilidades na Europa, declarou sua neutralidade (CERVO; BUENO, 2002). "O governo do Brasil abster-se-á de qualquer ato que, direta ou indiretamente, facilite, auxilie ou hostilize a ação dos beligerantes" (apud HILTON, 1994, p. 324), afirmou a circular transmitida pelo Itamaraty às missões diplomáticas brasileiras.
Outras nações americanas fizeram o mesmo, mas havia a necessidade de unificar a posição continental. Em vista disso, e obedecendo ao que a Conferência de Lima previa, o governo dos EUA convocou uma reunião de consulta dos chanceleres americanos para discutir a posição do continente perante a nova situação européia. A Conferência foi marcada para o vigésimo terceiro dia setembro de 1939, na república centro-americana do Panamá.
Como aconteceu em Lima em 1938, Aranha não participou da reunião, apesar de se tratar de uma conferência dos chanceleres. O ministro alegou, mais uma vez, que a situação nacional exigia sua presença no País e enviou o embaixador brasileiro nos EUA, Carlos Martins. Na verdade, durante seu período como chanceler, Aranha pouco se ausentou do País. A instabilidade internacional e a heterogeneidade do governo de Vargas, dividido entre simpatizantes da Alemanha e da democracia liberal, obrigavam-no a permanecer no Brasil para sempre estar perto da decisão. Dessa forma, qualquer investida dos militares poderia ser prontamente rebatida pelo chanceler.
Tanto alemães quanto franceses e britânicos concordavam com a neutralidade americana, porém em diferentes termos. A neutralidade defendida pela Alemanha previa a continuação do comércio além das fronteiras européias, posição defendida pela Argentina e, em documento divulgado estabelecendo os termos da neutralidade, pelo Brasil. Ora, os britânicos pretendiam controlar as comunicações entre os continentes, utilizando sua poderosa frota marítima, decisão que pretendia isolar os alemães. Essa interpretação era aceita pelos EUA. Dessa forma, as posições do Brasil e EUA divergiam [23]
Aberta a Conferência, foi elaborada uma pauta de discussão que constava de três pontos: as questões relativas à aplicação da neutralidade do Novo Mundo; a proteção da paz no hemisfério ocidental; e a cooperação econômica continental, para enfrentar os inevitáveis problemas econômicos advindos da guerra. O caráter obrigatório, impraticável para os argentinos, foi afastado, pois a Conferência decidiu, tal com em Lima, que faria apenas recomendações (SEITENFUS, 2003).
A Conferência durou uma semana e foi bem-sucedida aos olhos do Departamento de Estado dos EUA e do Itamaraty. Foram aprovados três documentos principais: a Declaração Geral da Neutralidade, que versava sobre a neutralidade coletiva do continente; a Declaração do Panamá, que instituía uma zona de segurança continental marítima, para tornar efetivo o princípio de paz continental, estendendo o mar territorial muito além das três milhas previstas, à época, no direito do mar; e uma declaração de princípios de solidariedade continental. O sucesso da Conferência, segundo Sumner Welles, subsecretário de Estado dos EUA, deveu-se "em sua maior parte à visão e aos esforços de Aranha" (apud HILTON, 1994, p. 325).
Aranha, mesmo longe do Panamá, coordenou as ações da delegação brasileira e foi responsável direto pela redação do documento lido pelo embaixador Martins que versava sobre mar continental, que integrou o segundo documento, a Declaração do Panamá. Finda a Conferência, Welles enviou uma carta de agradecimento à embaixada estadunidense no Rio de Janeiro nesses termos:
Tenha a bondade de expressar, mais uma vez, ao Ministro das Relações Exteriores, quão profundamente apreciei a magnífica cooperação prestada pela Delegação brasileira, e especialmente por ele (...) Queria dizer-lhe, também, que a declaração lida, ontem, pelo Chefe da Delegação brasileira, constitui um dos documentos mais eloqüentes de que já tive conhecimento, exercendo profunda influência sobre a Conferência (apud CAMARGO; ARAÚJO; SIMONSEN, 1996, p. 209).
Segundo Seitenfus (2003), o resultado mais importante da Reunião Extraordinária dos Ministros das Relações Exteriores Americanos foi conservar uma atitude de neutralidade continental aprovada por todos os países. A neutralidade atendeu aos anseios de todos: dos beligerantes, apesar da discordância em torno da zona de segurança, e dos países americanos, até mesmo a Argentina, com sua proposta de política externa universalista.
Somente a declaração de neutralidade foi bem recebida pelos beligerantes. A zona de segurança continental, medida que influenciaria as operações navais no Atlântico, provocou reações contrárias. A França e a Inglaterra consideraram a medida uma ação unilateral e prejudicial aos beligerantes, pois limitava por demais o teatro de operações no Atlântico. Para a Alemanha, a medida foi extremamente negativa, pois permitia à marinha britânica concentrar-se em um espaço menor, aumentando seu poderio comparativo.
No entanto, como fazer valer, na prática, a neutralidade do continente? Com exceção dos EUA, nenhum País americano tinha condições de patrulhar suas fronteiras para tornar efetivo o respeito à neutralidade. O caso do Brasil era mais complicado, devido a seu enorme litoral voltado para o Oceano Atlântico. Por várias vezes, a zona de segurança foi desrespeitada pelos beligerantes[24]
Após a invasão da Polônia, o conflito entrou em um momento de "guerra falsa"[25], tendo suas batalhas ocorrendo somente em alto-mar. Esse período foi de setembro de 1939 a abril de 1940. Com o Atlântico sendo o principal campo de batalhas, o bloqueio marítimo da marinha britânica estava eliminando o comércio entre o Brasil e a Alemanha. Em apenas um ano, de 1939 a 1940, as importações nacionais de produtos alemães caíram mais de 500%, passando de 585 mil contos de réis para apenas 80 mil. Já as exportações para a Alemanha caíram mais de 300%.
O bloqueio marítimo também impossibilitou a chegada de um carregamento de armas da empresa alemã Krupp, encomendado antes da guerra. Aranha se esforçou para obter dos ingleses a autorização para que o carregamento pudesse chegar ao Brasil, não por crer na necessidade desses armamentos, mas para atender às reclamações dos chefes militares, que consideravam o carregamento essencial para a defesa nacional [26]O próprio embaixador alemão no Rio, Prüffer, não se enganava a respeito do chanceler, pois sabia da inclinação de Aranha em favor dos EUA. Finalmente, após meses de negociação e após a mediação estadunidense, o Brasil pôde receber a encomenda da Krupp (HILTON, 1994). Com certeza não era do interesse dos EUA que o Brasil recebesse a encomenda alemã. Porém, a atitude estadunidense se explicava pela necessidade de fortalecer a posição de Aranha no governo, que estava se desgastando com as pressões dos chefes militares do governo brasileiro.
A "guerra falsa" terminou em abril de 1940, quando o exército nazista iniciou sua campanha ao norte, atacando a Noruega e a Dinamarca. No mês seguinte, ao décimo dia, teve início o ataque a Holanda, Bélgica e Luxemburgo, países declaradamente neutros. No dia 11 de maio, em carta ao presidente Vargas, o chanceler demonstrou sua indignação
Já não é a agressão à Holanda, Bélgica e Luxemburgo, sob motivo inteiramente injustificado, mas o bombardeio de cidades indefesas, de populações civis (...) Sou pela neutralidade e pela paz. Fui e serei contrário a qualquer ato de parcialidade e de imprudência porque quero ver o Brasil cada vez mais afastado dos riscos da guerra e dos de dela participar (...) Mas, Getúlio, há nesse acervo de velharias algumas regras que são vitais para nós. Entre elas a condenação da agressão quando do forte contra o fraco e sem que haja, direta ou indiretamente, provocado ou sequer motivado o ato de invasão. Há, ainda, o do bombardeio de cidades abertas e de populações civis indefesas, rematado no ataque à Haia, a rainha da paz (apud HILTON, 1994, p. 329).
Com a carta, Aranha tentou fazer que Vargas se posicionasse, condenando as ações do exército alemão. No entanto, não estava nos planos do presidente romper tão cedo a eqüidistância pragmática. Em discurso no dia 13 de abril, Vargas rejeitou o conselho do chanceler e, reafirmando a neutralidade do Brasil, afirmou que "como o cauteloso Ulisses, devemos conservar os olhos e os ouvidos desviados dos encantos e dos enlevos das sereias que rondam o nosso mar" (apud HILTON, 1994, p. 330).
O avanço do exército alemão não conhecia adversário e, ainda no mês de maio, as forças nazistas chegaram à França. O exército francês, vitorioso em 1918, foi derrotado em seis semanas, quando, em 14 de junho, as tropas alemãs ocuparam Paris. O sucesso da "guerra relâmpago" [27] era irresistível e, naquele momento, a Alemanha, agora junto com a Itália que também declarara guerra aos franceses, parecia invencível.
5.3 A Negociação
A partir de 1939, após a missão Aranha, as conversações entre Brasil e EUA se tornaram mais freqüentes. As negociações se concentraram em três principais questões: a modernização do equipamento militar brasileiro, o projeto de defesa continental e a cooperação econômica, visando, por parte do Brasil, à construção da usina siderúrgica. No entanto, as negociações bilaterais enfrentaram grandes impasses. Quanto à modernização do equipamento militar, os EUA a condicionavam à instalação de uma base militar em Natal[28]o que gerou impasses com os chefes militares, e a um projeto de defesa continental. Inclusive, segundo Bandeira (1998), houve a ameaça estadunidense de ocupar o Nordeste se Vargas não lhes cedesse as bases. Já quanto à cooperação econômica, tentando fugir do crivo do Congresso estadunidense, os EUA sondaram a siderúrgica United Steel para financiar o projeto brasileiro. A empresa recusou, condicionando as negociações ao problema da suspensão do pagamento dos juros da dívida externa.
Devido ao conflito de interesses, as negociações brasileiras com os EUA estavam emperradas. Nesse clima, o sucesso do exército alemão influenciou Getúlio Vargas. Era hora de agir. No dia 11 de junho de 1940, ainda durante a ocupação da França, Vargas pronunciou o famoso discurso, a bordo do encouraçado Minas Gerais, simpático aos países do Eixo.
Atravessamos, nós, a Humanidade inteira transpõe, um momento histórico de graves repercussões, resultante da rápida e violenta mutação de valores. Marchamos para um futuro diverso de quanto conhecíamos em matéria de organização econômica, social ou política, e sentimos que os velhos sistemas e fórmulas antiquados entram em declínio. Não é, porém, como pretendem os pessimistas e conservadores empedernidos, o fim de uma civilização, mas o início, tumultuoso e fecundo, de uma era nova. Os povos vigorosos, aptos à vida, necessitam seguir o rumo de suas aspirações, em vez de se deterem na contemplação do que se desmorona e tomba em ruína. É preciso, portanto, compreender a nossa época e renovar o entulho das idéias mortas e dos ideais estéreis (apud FALCÃfO, 1999, p.34-35).
O presidente prosseguiu,
Passou a época dos liberalismos imprevidentes, das demagogias estéreis, dos personalismos inúteis e semeadores de desordem. À democracia política substitui a democracia econômica, em que o poder, emanado diretamente do povo e instituído para a defesa do seu interesse, organiza o trabalho, fonte do engrandecimento nacional e não meio e caminho de fortunas privadas. Não há mais lugar para regimes fundados em privilégios e distinções (apud CAMARGO; ARAÚJO; SIMONSEN, 1996, p. 227).
A intenção de Vargas não era se mostrar pró-Eixo. Era, contudo, dar um sinal aos EUA de que se eles não cooperassem com o Brasil, o País não hesitaria em aceitar a cooperação de outros países, inclusive da Alemanha. De acordo com João Falcão (1999), Vargas queria mostrar que o Brasil fazia uma política independente e a neutralidade brasileira não era ditada pelos EUA.
Não obstante as intenções de Vargas, o discurso teve grande repercussão no Brasil e no exterior, para a surpresa do próprio presidente. Internamente, o discurso serviu para ressuscitar os integralistas, que estavam na sombra da ilegalidade. O mais contrariado com o discurso foi o chanceler, que chegou a ameaçar demitir-se se o presidente não divulgasse uma nota explicitando suas verdadeiras razões. Contudo, no dia seguinte, Vargas divulgou, por intermédio do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), comunicado tentando explicar-se:
O discurso pronunciado pelo presidente Getúlio Vargas a 11 do corrente não traz qualquer modificação à política internacional do Brasil. Teve por objetivo, tão somente, a vida interna do seu país e chamar a atenção dos brasileiros para as transformações que se estão operando no mundo, justificando, assim, a necessidade de se fortalecer o Estado, econômica e militarmente (grifo do autor). Procurou o presidente da República, além disso, alertar o espírito de seus patrícios prevenindo-os contra o desânimo e o pessimismo (...) As relações entre o Brasil e as outras nações da América, principalmente os Estados Unidos, nunca foram tão boas quanto agora (apud SEITENFUS, 2003, p. 214).
Nota-se que a ameaça de demissão é uma arma recorrente do ministro. Essa foi a quinta vez que Aranha ameaçou demitir-se. Até esse momento, cumpriu a promessa apenas uma vez, quando deixou o ministério da Fazenda para assumir a embaixada em Washington. O chanceler não hesitava em recorrer à amizade com Vargas para alcançar seus objetivos.
A explicação foi direcionada, principalmente, para os EUA, onde o discurso de 11 de junho teve repercussão catastrófica, exigindo a ação de Aranha. Quando a íntegra do discurso foi divulgada, o embaixador estadunidense, Jefferson Caffery, pediu uma entrevista a Aranha, fazendo que Dutra e Góes Monteiro estivessem presentes, para manifestar a consternação do governo dos EUA perante o discurso proferido pelo presidente Vargas.
Já nos países do Eixo, o discurso foi recebido com grande agrado. Freitas Valle, embaixador em Berlim, escreveu a Vargas para informar o conteúdo dos elogios dirigidos a ele pela imprensa alemã. O embaixador observou que uma das manifestações, a da Rádio Berlim, "declarou que o senhor Getúlio Vargas era o primeiro estadista americano que reconhecia e proclamava a fraqueza das Democracias e o vigor dos regimes Totalitários" (apud SEITENFUS, 2003, p. 214). O presidente, dessa forma, resolveu alimentar o sonho alemão. O embaixador alemão no Rio, Prüffer, recomendou que seu País oferecesse a Vargas o auxílio para a construção da usina siderúrgica e a assinatura de contratos para a compra de produtos brasileiros após o fim da guerra. Quando a Wilhelmstrasse aceitou a proposta de Prüffer, o embaixador se encontrou secretamente com Vargas, sem que Aranha tomasse conhecimento. A embaixada alemã sabia da posição pró-EUA de Aranha. Por isso, todas as conversações, oficiosas na sua maioria, eram com Vargas ou com os chefes militares.
No encontro, Vargas lamentou a interrupção do comércio com a Alemanha e deu a entender que o Brasil manteria sua neutralidade pró-Eixo, porém nenhum acordo foi firmado. No entanto, a porta estava aberta (HILTON, 1994). Assim, formava-se no País uma política externa paralela à praticada pelo Itamaraty. Enquanto Aranha não poupava esforços para aproximar Brasil e EUA, em um ideal pan-americano de cooperação, Vargas mantinha contatos com Prüffer e, ainda, recebia mensagem secretas do deselegante ex-embaixador alemão, Karl Ritter.
O chanceler teve de trabalhar dobrado nos dias que sucederam ao discurso. Aranha pôde se considerar relativamente vitorioso, pois suas manifestações para que Vargas se explicasse e o relatório do DIP fizeram que a interpretação quase unanimemente aceita fosse a de que o discurso foi direcionado a situação interna e não uma tomada de posição com relação ao conflito europeu. Aranha saiu fortalecido e a eqüidistância pendeu, mais uma vez, para o lado pan-americano.
Dissipada a poeira das reações ao discurso do dia 11 de junho, Vargas decidiu se pronunciar mais uma vez, no dia 29 de julho. O chanceler, um dia antes do discurso, escreveu uma carta para o presidente tentando dissuadi-lo a não retomar o tema que causara tanta comoção. Aranha considerava "um erro voltar a um episódio que já se encerrou fora do país e que aqui só devemos conservar aberto para melhor considerar suas repercussões e seus efeitos" (apud CAMARGO; ARAÚJO; SIMONSEN, 1996, p. 232). E prosseguiu
Por ocasião de teu discurso pronunciado a bordo do "Minas Gerais", viste como as tuas palavras foram interpretadas ao sabor das emoções dispersas pelo mundo e inteiramente desvirtuadas no sentido que lhes quiseste dar, o que, por si só, bastaria para aconselhar a maior cautela nos pronunciamentos dos governos, num ambiente internacional carregado de nervosismo (...) Além disso, Getúlio, ninguém poderá julgar ou dizer a última palavra sobre os acontecimentos que se desenrolam e que nada faz crer tenham atingido sua última fase (...) [todas essas razões] estão a indicar a necessidade da maior prudência e da maior parcimônia em nossos gestos e atitudes em face de forças desencadeadas que ameaçam transformar o mundo.
No entanto, mesmo com o apelo de Aranha, no dia seguinte o presidente proferiu seu discurso. Dessa vez, não tão controverso como o do dia 11 de junho. No discurso, Vargas explicou que não voltava atrás em nenhum conceito emitido e, pela primeira vez, apresentou sua tendência anti-semita, atacando os elementos indesejáveis, sem pátria e preparadores de guerra. Concluiu reafirmando a neutralidade brasileira sem gerência externa de qualquer coloração ideológica.
O chanceler sentiu-se constrangido pela atitude do presidente e, quando da convocação de uma nova reunião extraordinária, marcada para acontecer em Havana, tentou transferi-la para o Rio de Janeiro, com objetivo de reafirmar o pan-americanismo do Brasil. Porém, devido aos já avançados preparativos na capital cubana, a reunião não pôde ser transferida, mas os EUA se comprometeram a realizar uma próxima reunião no Rio de Janeiro (SEITENFUS, 2003).
A Reunião Extraordinária dos Ministros das Relações Exteriores Americanos de Havana, realizada entre os dias 21 e 30 de julho de 1940, foi convocada devido à derrocada francesa e holandesa no conflito europeu. Ambos os países tinham colônias no Novo Mundo e era de interesse dos EUA que a soberania desses países não fosse transferida para a Alemanha nazista. Era também mais uma oportunidade de reafirmar a neutralidade do continente e de discutir os moldes da necessária cooperação econômica.
Como das outras vezes, Aranha não viajou para Havana, apesar dos apelos dos chanceleres do continente. O próprio presidente cubano, Frederico Laredo Brú, em carta ao presidente Vargas, insistiu para que o chanceler fosse convencido a presidir a delegação brasileira. Na correspondência, o presidente cubano afirmou que "somente a publicação de sua possível ausência põe em dúvida o êxito da Reunião" (apud CAMARGO; ARAÚJO; SIMONSEN, 1996, p. 237). No seu lugar, Aranha enviou, para chefiar a delegação brasileira, o embaixador Maurício Nabuco, secretário-geral do Itamaraty.
O resultado mais imediato da Reunião foi sobre a administração provisória de colônias e possessões européias na América. Com esse intuito, foi criada a Comissão Interamericana para a Administração Territorial das Colônias e Possessões Européias na América, composta por representantes de quatorze países americanos[29]Também foi criada uma comissão econômica, com sede em Washington, encarregada de estudar meios para fortalecer a cooperação entre os países americanos.
No decorrer do ano de 1940, as negociações entre o Brasil e os EUA se intensificaram. Parecia que os discursos de Vargas haviam dado resultado. Para alimentar o temor de Washington, o Itamaraty sempre os alertava dos perigos da infiltração alemã, tanto comercial como ideológica (CERVO; BUENO, 2002). Para tratar do financiamento para o complexo siderúrgico, Guilherme Guinle, presidente do Comitê Executivo Brasileiro para a Indústria Siderúrgica, viajou para os EUA.
Em setembro e ainda sem um acordo firmado, o Itamaraty voltou a inquietar Washington com os supostos avanços alemães. Aranha chegou a comentar com Caffery que a germânica Krupp havia feito uma "oferta muito atraente" a respeito de um financiamento para a construção do complexo siderúrgico. Finalmente, os EUA se convenceram da necessidade de uma cooperação mais estreita com o Brasil que, devido à posição geográfica e ao tamanho, merecia tratamento especial. A 25 de setembro de 1940, Guinle, representante brasileiro, e Jesse Jones, presidente do Eximbank, firmaram um acordo que previa a concessão de auxílio técnico e financeiro para a construção de uma usina siderúrgica em Volta Redonda. O investimento inicial seria de 45 milhões de dólares e também previa a abertura de um escritório de estudos, no qual engenheiros brasileiros e estadunidenses formariam uma equipe [30]
Com os acordos brasileiros com os EUA, a eqüidistância pragmática estava quase no fim. Faltava a questão da modernização das forças armadas brasileiras e, nesse quesito, as negociações com os EUA estavam bastante incipientes. Ironicamente, a maior ajuda de Washington nessa questão foi interceder junto à Inglaterra para que um carregamento de armas alemão pudesse chegar ao Brasil. O episódio se repetiu em novembro de 1940, quando o cargueiro brasileiro Siqueira Campos foi interceptado pela marinha britânica, quando saía de Lisboa com mais um carregamento de equipamento militar da Krupp, adquirido em 1938. Primeiramente, o cargueiro não tinha permissão da marinha britânica para deixar Lisboa. No entanto, Aranha autorizou a partida mesmo assim, pressionado no Brasil pelos chefes militares. O Brasil cogitou romper relações diplomáticas com a Inglaterra. Porém, como da vez anterior, a mediação de Washington encerrou a querela e o cargueiro brasileiro foi liberado, com a promessa de Aranha que esse seria o último carregamento (HILTON, 1994).
Voltando às negociações entre Brasil e EUA em torno do equipamento militar, a principal dificuldade era que, para os EUA, qualquer cooperação militar só poderia inscrever-se no âmbito de um projeto de defesa continental. O Brasil se opunha a essa tese, reafirmando que o País merecia tratamento diferenciado das pequenas repúblicas e também recusou a idéia de colocar seu território à disposição dos vizinhos.
A intransigência de ambas as partes dificultou sobremaneira a cooperação. Em janeiro de 1941, foi assinado um primeiro acordo bilateral, objetivando instalar no Rio de Janeiro missões do Exército e da Aeronáutica estadunidenses [31]Contudo, esse acordo não foi considerado suficiente, e os chefes militares brasileiros estavam muito insatisfeitos.
Alertados pelo embaixador Caffery da crescente pressão dos militares brasileiros e da posição delicada de Aranha, representantes de Washington, finalmente, decidiram preparar um acordo padrão para o lend-lease (empréstimo e arrendamento). Em outubro de 1941, por fim, Brasil e EUA assinaram um acordo no qual Washington se comprometia a fornecer até cem milhões de dólares de equipamento militar ao Brasil até 1944.
5.4 Pearl Harbor e a Conferência do Rio de Janeiro
No amanhecer do dia 7 de dezembro de 1941, a força aérea japonesa lançou ataque à base estadunidense de Pearl Harbor, situada no Havaí. Foram mais de duas mil mortes e vários encouraçados, cruzadores, destróieres, lança-minas, navios auxiliares e aviões foram destruídos ou seriamente danificados (ARGUELHES, 1996).
O ataque japonês mudou completamente o contexto, provocando a entrada dos EUA na guerra. Primeiramente, um dia após o ataque, os EUA declaram guerra ao Japão, que já fazia parte do Eixo. No dia 11, alemães e italianos declaram guerra aos EUA, fazendo que os estadunidenses entrassem de vez no conflito, que chegava ao Novo Mundo. A entrada dos EUA na guerra suscitou a solidariedade continental.
No dia seguinte ao ataque, Vargas reuniu seu gabinete, que decidiu, unanimemente, declarar solidariedade aos EUA, junto com outros países do continente. Argentina e Chile consideraram os EUA não-beligerantes. Já Nicarágua, Honduras, Guatemala, Haiti, El Salvador, República Dominicana, Panamá e Costa Rica declararam guerra ao Japão. México e Colômbia romperam relações diplomáticas com o Japão. E o Uruguai condenou a agressão japonesa e concedeu aos EUA o uso de seus portos (CAMARGO; ARAÚJO; SIMONSEN, 1996).
Era hora de uma nova Reunião Extraordinária para dar corpo à união continental frente ao ataque japonês. O objetivo dos EUA era fazer que todo o continente rompesse relações diplomáticas com o Eixo. Nesse sentido, a Argentina continuaria sendo o principal problema, pois não aceitaria a obrigatoriedade das resoluções e manteria a neutralidade. Dessa vez, também o Chile se opunha à obrigatoriedade do rompimento. O País temia por seu imenso litoral voltado para os japoneses. De resto, todos os outros países do continente concordavam com o rompimento e, inclusive, alguns países já o haviam feito.
A Conferência, marcada para ter início no dia 15 de janeiro, seria presidida por Aranha, fato que, para os EUA, era de extrema importância. O próprio presidente Roosevelt escreveu diretamente ao chanceler brasileiro, afirmando
(estar) ciente (...) de que a presidência da reunião estará nas mãos de um estadista que tem tão ampla e compreensiva visão do significado da solidariedade hemisférica. Acompanhei durante os últimos anos, com grande interesse e a maior admiração, sua direção da política exterior do Brasil (...) Desejo expressar-lhe pessoalmente minha profunda gratidão por tudo o que tem feito e por tudo o que está fazendo para tornar a solidariedade do Hemisfério uma realidade (apud HILTON, 1994, p. 383).
Não só o presidente, também a imprensa estadunidense aplaudiu o fato de Aranha ser o presidente da Conferência do Rio. A revista Time, na capa da edição de 19 de janeiro de 1942, estampou o chanceler brasileiro, evidenciando a importância de Aranha ser o presidente da Conferência (anexo A, p, 78).
Aranha parecia, finalmente, ter conseguido fazer que a cooperação com os EUA tomasse forma. O chanceler teve papel importante nos acordos para a construção do complexo siderúrgico e da modernização das forças armadas, e a Conferência do Rio era a oportunidade de coroar todos os esforços em favor do pan-americanismo, presidindo a Reunião.
A Conferência causou grande comoção entre a população. No dia 12, três dias antes do início da Conferência, a chegada de Sumner Welles, chefe da delegação estadunidense, encontrou grande multidão em frente ao aeroporto Santos Dumont, onde Aranha já o esperava.
Às 17:30 do dia 15 de janeiro de 1942 teve início, no Palácio Tiradentes, a Conferência do Rio de Janeiro. A essa hora, o centro da cidade estava congestionado. Alto-falantes foram montados na entrada do Palácio para transmitir, para o público que se aglomerava no local, o discurso inaugural proferido por Vargas e os outros proferidos no primeiro dia.
A primeira vitória de Aranha na Conferência do Rio se deu com o discurso de abertura da Reunião, proferido por Vargas (anexo B, p. 79), quando foi explicitada a posição brasileira. O presidente enfatizou que
(a posição brasileira objetiva) defender, palmo a palmo, o próprio território contra quaisquer incursões e não permitir (que) possam as suas terras e águas servir de ponto de apoio para o assalto a Nações irmãs. Não mediremos esforços para a defesa coletiva, faremos o que as circunstâncias reclamarem e nenhuma medida deixará de ser tomada a fim de evitar que, portas adentro, inimigos ostensivos ou dissimulados se abriguem e venham a causar dano, ou pôr em perigo a segurança das Américas. (apud SEITENFUS, 2003, p. 273).
Como presidente da Conferência, Aranha tomou a palavra (anexo D, p. 80), agradecendo a indicação, defendendo o rompimento das relações com o Eixo e o alinhamento aos EUA, pois
Não deixaram os agressores, com seu ato, alternativa para os povos continentais, nem mesmo para os seus admiradores e adeptos. Esta é a razão pela qual nos reunimos aqui não somente porque as nossas terras, as nossas fronteiras, as nossas costas estejam ameaçadas, ou possam ser igualmente atacadas (mas também) a nossa religião, a nossa moral, as nossas famílias, as nossas raças, as nossas instituições, as nossas liberdades, enfim, as nossas idéias, estão em risco iminente de perecer (apud SEITENFUS, 2003, p. 273).
Não obstante a clareza da posição brasileira, os embaixadores dos países do Eixo escrevem carta ao chanceler apelando para que o Brasil não rompesse com seus países e que tentasse dissuadir as outras Nações do continente de fazerem (FALCÃfO, 1999). A redação e o tom das cartas, alguns de clara ameaça, eram diferentes, mas o apelo era o mesmo. Aranha respondeu aos embaixadores, em um só texto:
Ainda que apreciando o apelo que Vossa Excelência me dirige, em minha qualidade de presidente da conferência, é meu dever lembrar-lhe, senhor embaixador, que o Brasil sempre manteve, no conflito europeu, uma neutralidade tida como exemplar. A agressão do Japão a um país do continente americano, seguida da declaração de guerra da Alemanha e da Itália, nos impõe rumo diferente, que o superior interesse do continente indicará. Escrevendo a Vossa Excelência com a mesma franqueza, desejo ponderar que o rompimento de relações diplomáticas e comerciais é medida de alcance restrito, que não implica, de acordo com o direito das gentes, no estado de guerra. Se o governo da Alemanha (Itália ou Japão) entender, porém, levar tão longe a sua reação, o Governo brasileiro muito o lamentará, seguro, entretanto, de que os seus atos o exoneram de tal responsabilidade (apud CAMARGO; ARAÚJO; SIMONSEN, 1996, p. 274).
Se, na Conferência, o problema a ser contornado era a recusa de Argentina e Chile em romper as relações com o Eixo, internamente o problema eram os chefes militares, Dutra e Góes Monteiro. Eles eram contra o rompimento e chegaram a por seus cargos à disposição do presidente. Para eles, havia dois problemas principais, além da fraqueza militar do País, no relacionamento com os EUA: aquele País, quase sempre, falhava em suas promessas, e os armamentos destinados ao Brasil ainda não haviam chegado, e Washington não entendia que, para o Brasil, o maior problema estratégico era com a Argentina.
Em vista disso e consciente dos esforços de Aranha, e agora de Vargas, na Reunião dos chanceleres, Welles escreveu a Roosevelt, esclarecendo a urgência de iniciar o fluxo de tanques, veículos, aviões e armas ao Brasil. Só com a concordância dos chefes militares brasileiros, pilares do Estado Novo, o rompimento poderia se efetivar (HILTON, 1994).
A Conferência do Rio, apesar dos esforços de Aranha, não conseguiu contornar o problema argentino. O que prevaleceu, mais uma vez, foi a forma da recomendação. A Conferência confirmou a decisão de se romperem as relações diplomáticas com a Alemanha, Itália e Japão, mas com caráter não-obrigatório. Para o jornal estadunidense The New York Times , a fórmula recomendatória foi "maior vitória diplomática da Argentina" (apud ARGUELHES, 1996, p. 38). Dos 22 Estados americanos presentes na Conferência, somente Argentina e Chile não romperam as relações diplomáticas e comerciais com o Eixo.
Para Moura (1991), a Conferência serviu, entre outras coisas, para que os EUA pudessem obter uma visão comum dos problemas internacionais e também para realizar ações comuns, fortalecendo a liderança estadunidense. Com o rompimento brasileiro com o Eixo, acabava, de vez, a política de eqüidistância pragmática empregada pelo Estado Novo. A Conferência também fortaleceu Aranha internamente como principal homem do gabinete do Estado Novo.
O próprio chanceler se encarregou de pronunciar no encerramento da Reunião, para as centenas de pessoas que se aglomeravam em frente ao Palácio Tiradentes, o principal resultado da Reunião. Aranha anunciou que
(...) Essa é a razão pela qual, hoje às 6 horas da tarde, pela ordem do eminente presidente dessa República, os embaixadores do Brasil em Berlim, em Tóquio e o encarregado de negócios do Brasil em Roma, passaram nota aos governos junto aos quais estão acreditados comunicando que, em virtude da recomendação terceira da Reunião de Consulta dos ministros das Relações Exteriores das Repúblicas americanas, o Brasil rompia suas relações diplomáticas com a Alemanha, com a Itália e com o Japão (ARANHA, 2007).
A recomendação terceira à qual o chanceler se refere, estabelece que
The American Republics, in accordance with the procedures established by their own laws and in conformity with the position and circumstances obtaining in each country in the existing continental conflict, recommend the breaking of their diplomatic relations with Japan, Germany and Italy, since the first-mentioned State attacked and the other two declared war on an American country (FINAL…, 2007).
Ao retornar para os EUA, Sumner Welles escreveu carta a Aranha, não poupando elogios pela sua atuação na Conferência do Rio:
Acho difícil demonstrar por palavras e com precisão tudo o que queria dizer-lhe a respeito as nossas últimas três semanas. (...) (Desejo) dizer-lhe que, em minha longa vida pública, nunca vi atuação de estadista mais brilhante do que a sua na direção da Conferência. Mais do que isso, representou ela em si um trabalho tão construtivo que, estou certo, será sempre considerada como uma das maiores obras de estadistas do Continente americano (apud CAMARGO; ARAÚJO; SIMONSEN, 1996, p. 282).
As reações da Alemanha e da Itália foram diferentes perante a decisão americana de pôr fim à neutralidade. Os alemães receberam a notícia com frieza. No dia seguinte à Reunião, Prüffer e seus colaboradores partiram para a Argentina, onde ficariam cumprindo suas atividades diplomáticas. Não houve nenhuma manifestação. Já os italianos se mostraram irritados. Mussolini chegou a pedir para que dissessem para o encarregado de negócios brasileiros em Roma que o Duce tinha memória de elefante e que chegaria o dia em que ele faria o Brasil pagar caro por essa decisão (SEITENFUS, 2003).
Com o fim da neutralidade, começou um período de rica cooperação entre o Brasil e os EUA. Entre os acordos firmados, sem dúvida o mais importante foi de 3 de março de 1942, em que, retomando as disposições de acordo de 1º de outubro do ano anterior, os EUA se comprometiam a fornecer, sob a forma de um lend-lease, armas e munição de guerra num total de 200 milhões de dólares, até janeiro de 1948.
O papel de Aranha desde sua posse como ministro das Relações Exteriores até a Conferência do Rio de Janeiro foi de estrita proximidade com a política de Washington. Para alcançar seus objetivos, além da capacidade diplomática, o chanceler não hesitou em apelar para o relacionamento especial que mantinha com o presidente Vargas, ameaçando demitir-se por mais de uma vez. Também não hesitou em alarmar Washington com supostas investidas nazistas no Brasil. O chanceler também conseguiu se manter firme perante as investidas da ala pró-Eixo do governo e, ainda, à política externa paralela do presidente Vargas. O resultado da Conferência do Rio foi, além de imprescindível para a construção da usina siderúrgica no Brasil e do reaparelhamento das forças armadas, uma vitória dos princípios que Oswaldo Aranha defendia desde o começo e que a evolução da situação internacional viria a confirmar.
Durante o ano de 1942, Alemanha e Itália cumpriram a ameaça que fizeram se o Brasil rompesse as relações com o Eixo. Alegando que o Brasil já era um País inimigo, começaram os ataques à desprotegida marinha mercante brasileira.
As agressões do Eixo continuaram e, em agosto, começaram os ataques a navios na costa brasileira. A situação causou enorme estupor na população e, na capital, uma imensa multidão se aglomerou na Avenida Rio Branco em direção ao Palácio do Itamaraty. Da sacada, Aranha discursou enfaticamente
A situação criada pela Alemanha e pelos seus aliados, praticando atos de beligerância, bárbaros e desumanos contra a nossa navegação pacífica e costeira, impõe uma reação à altura dos processos e dos métodos por eles empregados contra oficiais, soldados, mulheres, crianças e navios do Brasil. Posso assegurar aos brasileiros que me ouvem, como a todos os brasileiros, que, compelidos pela brutalidade da agressão, oporemos uma reação que há de servir de exemplo para os povos agressores e bárbaros, que violentam a civilização e a vida dos povos pacíficos (apud HILTON, 1994, p. 398).
No dia 31 de agosto, o Brasil oficializou o estado de guerra contra alemães e italianos[32]O Brasil entrou na guerra a contragosto. Não foi uma decisão guiada pelo pan-americanismo, mas por uma situação por demais injustificável, como o assassinato de brasileiros totalmente alheios ao conflito. O Brasil viria a participar ativamente no conflito com o envio da Força Aérea Brasileira (FAB) e da Força Expedicionária Brasileira (FEB), contribuindo com a libertação da Itália [33]
É inegável a importância de Oswaldo Aranha para a aproximação brasileira aos EUA em todos os momentos do Estado Novo: desde os efeitos positivos de sua nomeação para a chancelaria até os discursos de solidariedade continental em favor da declaração de guerra ao Eixo (anexo E, p. 80). Vargas, sempre ambíguo, ao nomear Aranha para a chancelaria parecia saber que o caminho do Brasil estava muito próximo dos caminhos dos EUA. Apesar de sempre esperar os acontecimentos internacionais para tomar sua decisão, Vargas não tinha dúvidas da importância de Aranha no relacionamento com os EUA, segundo o chanceler, o parceiro natural.
O alinhamento brasileiro aos Aliados, e a conseqüente vitória na guerra contra o Eixo, colocou o Estado Novo em posição desconfortável em meio às democracias vencedoras e causou seu fim. Nas eleições de 1945, Aranha era, para alguns observadores, o melhor candidato para governar um País democrático. Ironicamente, o candidato de Vargas e vencedor das eleições foi o germanófilo ministro da Guerra, Eurico Gaspar Dutra.
O chanceler continuaria no cargo até agosto de 1944, quando o governo, arbitrariamente, fechou a Sociedade dos Amigos da América [34]da qual Aranha era vice-presidente. Sua demissão causou grande comoção em todo o mundo ocidental e várias personalidades expressaram seu pesar pela demissão de Aranha. Fora do Itamaraty, voltou a dedicar-se a advocacia.
No governo de Dutra, Aranha representou o Brasil na recém criada ONU e teve participação destacada, presidindo a Assembléia Geral que decidiu pela partilha da Palestina e pela criação do Estado de Israel. No segundo governo de Vargas, voltou ao ministério da Fazenda e saiu após a morte do amigo presidente. Voltaria à ONU em 1960 para encerrar sua carreira política.
(VIEIRA, Márcio José. A Atuação de Oswaldo Aranha no Processo de Engajamento do Brasil na Segunda Guerra Mundial ao lado dos Estados Unidos. Universidade Católica de Brasília. Professores orientadores: Professor MSc. Carlos Eduardo Vidigal e Professor MSc. José Romero Pereira Júnior. Junho, 2007 - http://br.monografias.com/trabalhos3/oswaldo-aranha-processo-engajamento/oswaldo-aranha-processo-engajamento.shtml)
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