domingo, 31 de julho de 2011

sábado, 30 de julho de 2011

PHISOLOFANDO

Teses Provisórias para a Reforma da Filosofia
Ludwig Feuerbach

Apresentação
O significado de L. Feuerbach não se esgota com o fato de ter sido em parte, durante algum tempo, figura tutelar de K. Marx, nem a pertinência das suas ideias ficou definitivamente enfraquecida ou abalada com a crítica marxiana nas famosas Teses sobre Feuerbach. Pelo contrário, Marx e, mais tarde, Nietzsche nunca deixaram de lhe ser devedores na crítica que instituíram ao mundo moderno. Faltou, sem dúvida, quase totalmente a Feuerbach a reflexão sobre as condições sociais da emergência da nova civilização em que se encontrava, ou um sentido mais agudo da suspeita, mas a ele se deve em grande parte o mais rude golpe contra toda a teofilosofia idealista — com tudo o que ela implicava no postulado de uma diferença qualitativa entre consciência e sensibilidade, espírito e corpo, história e natureza, vontade e desejo.


Feuerbach desenvolveu a sua campanha da antiteologia mediante a acentuação da sensibilidade, da vida, da sensualidade; por meio da reabilitação das sensações, das impressões, das afecções, dos instintos, das pulsões etc., como lugares em que o Eu se liga à realidade. Apóstolo do evangelho da “Sinnlichkeit” (sensibilidade), de uma harmonia utópica entre homem e natureza (talvez seja possível uma recuperação “ecológica” do seu pensamento!), deixou de lado, por insistência nos fatores subjetivos e individuais, o papel determinante da ideologia, o laço entre a repressão sociocultural e o recalcamento da sensibilidade enquanto pulsão da felicidade (que constituirá o discurso essencial da psicanálise). Próximo de nós pela revalorização do corpo e pelo entusiasmo “naturalista”, torna-se-nos todavia estranho no seu vislumbre da utopia de uma reconciliação possível entre o “progresso” da civilização, o trabalho social e cultural e a satisfação do anseio de felicidade do homem. Tal reconciliação surge-nos cada vez mais mítica, em face das várias ameaças de catástrofe global e da intensificação da “miséria psíquica” segregada por múltiplos mecanismos da cultura atual.


Sem sistema coerente, ele é, apesar de tudo, um intérprete excepcional, ou melhor, um dos principais arautos da maior viragem espiritual do Ocidente moderno: a imanentização radical do homem, o corte decidido com a tradição cristã e com todos os elos do pensamento teológico, a que conscientemente e com fervor quase místico ele dá uma inflexão antropológica violenta e consequente. Não teme divinizar o Estado (aliás, muito na linha hegeliana), teologizar a política, realçar os vínculos humanos, levando a cabo nesta tarefa uma notável doutrina da imaginação no seu papel constitutivo e quase transcendental. Será essa teologizacão do homem uma contradição? Sem dúvida; e também, porventura, a confirmação de que o problema do Ocidente é fundamentalmente um problema teológico jamais resolvido — e que se encontra presente, inclusive no “imperativo tecnológico” elevado a valor absoluto.


***

O escrito aqui traduzido, juntamente com Necessidade de uma reforma da filosofia (1842) e Princípios da filosofia do futuro (1843), inscreve-se no período da maturidade de Feuerbach e proporciona ao leitor um contato com as vertentes essenciais do seu pensamento. Os três centram-se no projeto de uma “reforma da filosofia” e constituem, no essencial, um ajuste de contas com o idealismo, sobretudo o hegeliano.

Embora a edição de referência seja a edição crítica das Gesammelte Werke (Obras Completas), sob a responsabilidade e a direção de Werner Schuffenhauer e Wolfgang Harich e publicadas dela Akademie-Verlag de Berlim desde 1967, aqui utilizaram-se as Sämtliche Werke (Vol. II), ao cuidado de Wilhelm Bolin e Friedrich Jodl, e publicadas pela Frommann Verlag/Gunther Holzboog (1903-1911,1959) de Stuttgart, que também merecem confiança.
Artur Morão

Teses Provisórias para a Reforma da Filosofia
(1842)
Ludwig Feuerbach

O segredo da teologia é a antropologia, mas o segredo da filosofia especulativa é a teologia — a teologia especulativa que se distingue da teologia comum, porque transpõe para o aquém, isto é, atualiza, determina e realiza a essência divina que a outra, por medo e estupidez, exilava para o além.

Espinosa é o verdadeiro criador da moderna filosofia especulativa; Schelling é o seu restaurador e Hegel levou-a ao pleno cumprimento.

O “panteísmo” é a consequência necessária da teologia (ou do teísmo) — a teologia consequente; o “ateísmo” é a consequência necessária do “panteísmo”, ou “panteísmo consequente” [1].

O cristianismo é a contradição do politeísmo e do monoteísmo.

O panteísmo é o monoteísmo com o predicado do politeísmo: isto é, o panteísmo transforma os seres independentes do politeísmo em predicados, atributos de um Ser único e independente. Assim, Espinosa fez do pensamento, enquanto totalidade das coisas pensantes, e da matéria, enquanto totalidade das coisas extensas, atributos da substância, isto é, de Deus. Deus é uma coisa pensante, Deus é uma coisa extensa.

A filosofia da identidade distinguiu-se da filosofia espinosista tão-só por ter insuflado à coisa morta e indolente da Substância o espírito do idealismo. Hegel, em particular, fez da autoatividade, da força de autodistinção, da autoconsciência, um atributo da Substância. A proposição paradoxal de Hegel — “a consciência de Deus é a autoconsciência de Deus” — funda-se no mesmo fundamento que a proposição paradoxal de Espinosa — “a extensão ou a matéria é um atributo da Substância” — e tem apenas este sentido: a autoconsciência é um atributo da Substância ou de Deus; Deus é eu. A consciência que o teísta, diferentemente da consciência real, atribui a Deus é apenas uma representação sem realidade. Mas a proposição de Espinosa — a matéria é atributo da Substância — significa apenas que a matéria é a essencialidade divina substancial; de igual modo a proposição de Hegel diz apenas: a consciência é a essência divina.

O método da crítica reformadora da filosofia especulativa em geral não se distingue do já aplicado na filosofia da religião. Temos apenas de fazer sempre do predicado o sujeito e fazer do sujeito o objeto e princípio — portanto, inverter apenas a filosofia especulativa de maneira a termos a verdade desvelada, a verdade pura e nua.

O “ateísmo” é o “panteísmo” invertido.

O panteísmo é a negação da teologia, do ponto de vista da teologia.

Assim como, segundo Espinosa (Ética, Parte I, def. 3 e prop. 10), o atributo ou predicado da Substância é a própria substância, assim também, segundo Hegel, o predicado do Absoluto, do sujeito em geral, é o próprio sujeito. O Absoluto é, segundo Hegel, ser, essência, conceito (Espírito, autoconsciência). Mas o Absoluto, pensado unicamente como ser, é apenas ser; o Absoluto, pensado sob esta ou aquela determinidade ou categoria, é inteiramente absorvido nessa categoria, nesta determinidade, de maneira que, deixando estas de lado, ele é um simples nome. Mas, apesar disso, o Absoluto como sujeito subjaz como fundamento, e o verdadeiro sujeito, por cujo intermédio o Absoluto não é um simples nome mas alguma coisa, a determinação, tem sempre todavia o significado de um simples predicado, justamente como o atributo em Espinosa.

À luz da psicologia, o Absoluto ou Infinito da filosofia especulativa é simplesmente o não determinado, o indefinido — a abstração de todo o determinado, simultaneamente posto como um ser distinto desta abstração, mas logo de novo com ela identificado; mas, à luz da história, é apenas o velho Ser ou o monstro teológico-metafísico, não finito, não humano, não material, não determinado, não qualificado — o nada pré-mundano posto como ato.

A lógica hegeliana é a teologia reconduzida à razão e ao presente, a teologia feita lógica. Assim como o Ser divino da teologia é a quinta-essência ideal ou abstrata de todas as realidades, isto é, de todas as determinações, de todas as finidades, assim também a lógica. Tudo o que existe sobre a Terra se reencontra no céu da teologia — assim também tudo o que existe na natureza se reencontra no céu da lógica divina: a qualidade, a quantidade, a medida, a essência, o quimismo, o mecanismo, o organismo. Na teologia, temos tudo duas vezes: uma, de forma abstrata; outra, de forma concreta; na filosofia hegeliana, cada coisa é-nos dada duas vezes: como objeto da lógica e, em seguida, novamente como objeto da filosofia da natureza e do Espírito.

A essência da teologia é a essência do homem, transcendente, projetada para fora do homem; a essência da lógica de Hegel é o pensamento transcendente, o pensamento do homem posto fora do homem.

Assim como a teologia cinde e aliena o homem para, a seguir, de novo com ele identificar a sua essência alienada, assim Hegel multiplica e cinde a essência simples, idêntica a si, da natureza e do homem para, em seguida, de novo reconciliar à força o que fora violentamente separado.

A metafísica ou a lógica é apenas uma ciência real e imanente, se ela não estiver separada do chamado espírito subjetivo. A metafísica é a psicologia esotérica. Que arbitrariedade, que ato de força considerar a qualidade por si, a sensação por si, e separá-las às duas entre ciências particulares, como se a qualidade fosse alguma coisa sem a sensação e a sensação alguma coisa sem a qualidade.

O Espírito absoluto de Hegel nada mais é do que o chamado espírito finito, abstrato, separado de si, da mesma maneira que o Ser infinito da teologia nada mais é do que o ser finito, abstrato.

Segundo Hegel, o Espírito absoluto manifesta-se ou realiza-se na arte, na religião, na filosofia. Em vernáculo isto significa: o espírito da arte, da religião, da filosofia é o Espírito absoluto. Mas não é possível separar a arte e a religião da sensação, da fantasia e da intuição humanas, nem a filosofia do pensamento, em suma, o Espírito absoluto do espírito subjetivo ou da essência do homem, sem de novo nos transferir para o antigo ponto de vista da teologia, sem nos levar a tomar o Espírito absoluto por um outro espírito, diferente do ser humano, isto é, como um fantasma de nós mesmos, existindo fora de nós.

O “Espírito absoluto” é o “espírito defunto” da teologia, que assombra como fantasma a filosofia hegeliana.

A teologia é a fé nos fantasmas. A teologia comum tem os seus fantasmas na imaginação sensível, a teologia especulativa na abstração não sensível.

Abstrair significa pôr a essência da natureza fora da natureza, a essência do homem fora do homem, a essência do pensamento fora do ato de pensar. Ao fundar todo o seu sistema nestes atos de abstração, a filosofia hegeliana alienou o homem de si mesmo. Sem dúvida, identifica de novo o que separa; mas apenas de um modo que comporta novamente a separação e a mediação. À filosofia hegeliana falta a unidade imediata, a certeza imediata, a verdade imediata.

A identificação imediata, clara, leal, da essência do homem, subtraída ao homem pela abstração, com o homem não se pode deduzir da filosofia hegeliana por via positiva, mas apenas como a sua negação. Em geral, só se pode conceber e compreender se for concebida como a negação total da filosofia especulativa, embora ela seja a verdade da mesma. Tudo está, decerto, implicado na filosofia hegeliana, mas sempre e ao mesmo tempo com a sua negação e o seu contrário.

A prova evidente de que o Espírito absoluto é o chamado espírito finito, subjetivo, portanto, de que aquele não se pode e deve deste separar — é a arte. A arte nasce do sentimento de que a vida neste mundo é a vida verdadeira, de que o finito é o infinito — nasce do entusiasmo que vislumbra num ser determinado e real o Ser supremo e divino. O monoteísmo cristão não tem em si qualquer princípio de cultura artística e científica. Só o politeísmo, o chamado culto dos ídolos, é a fonte da arte e da ciência. Os Gregos elevaram-se à plenitude da arte plástica unicamente porque viram na forma humana, de um modo incondicional e sem hesitação, a forma suprema, a forma da divindade. Os cristãos só chegaram à poesia depois de terem negado praticamente a teologia cristã, quando veneraram o Ser divino como o ser feminino. Os cristãos foram artistas e poetas em contradição com a essência da sua religião, tal como a representavam, tal como era objeto da sua consciência. Por motivos religiosos, Petrarca arrependeu-se dos poemas em que divinizara Laura. Por que é que os cristãos não têm, como os pagãos, obras de arte adequadas às suas representações religiosas? Por que é que não têm nenhuma imagem de Cristo que plenamente os satisfaça? Porque a arte religiosa dos cristãos fracassa perante a contradição fatal entre a sua consciência e a verdade. Segundo a verdade, a essência da religião cristã é a essência humana, mas, para a consciência dos cristãos, é uma essência estranha, não humana. Cristo deve ser homem e também não homem; é uma anfibolia. Mas a arte só pode representar o verdadeiro, o inequívoco.

A consciência resoluta, feita carne e sangue, de que o humano é o divino e o finito é o infinito é a fonte de uma nova poesia e arte, que superará em energia, profundeza e chama todas as artes precedentes. A fé no além é uma fé absolutamente apoética. A dor é a fonte da poesia. Só quem experimenta a perda de um ser finito como perda infinita tem força para o fogo do lirismo. Só o encanto doloroso da recordação do que já não existe é o primeiro artista, o primeiro idealista no homem. Mas a fé no além transforma toda a dor em aparência e em inverdade.

A filosofia, que deduz o finito do infinito, o determinado do indeterminado, nunca chega a uma verdadeira posição do finito e do determinado. Deduzir o finito do infinito é determinar e negar o infinito e o indeterminado; é admitir que, sem determinação, ou seja, sem finidade, o infinito nada é, é confessar que o finito se põe como a realidade do infinito. Mas como a quimera negativa do Absoluto permanece como fundamento, a finitude posta é sempre de novo suprimida. O finito é a negação do infinito e, por seu turno, o infinito é a negação do finito. A filosofia do Absoluto é uma contradição.

Assim como na teologia o homem é a verdade, a realidade de Deus — pois todos os predicados que realizam Deus como Deus e fazem de Deus um ser real, assim como o poder, a sabedoria, a bondade, o amor, e a própria infinidade e personalidade, enquanto têm por condição a distinção do finito, só se põem em e com o homem — assim também, na filosofia especulativa, o finito é a verdade do infinito.

A verdade do finito é expressa pela filosofia absoluta só de um modo indireto e invertido. Se, pois, o infinito só existe, só tem verdade e realidade quando determinado, isto é, quando não se põe como infinito, mas como finito, então o finito é efetivamente o infinito.

A tarefa da verdadeira filosofia não é reconhecer o infinito como o finito, mas o finito como o não finito, como o infinito; ou não é transpor o finito para o infinito, mas o infinito para o finito.

O começo da filosofia não é Deus, não é o Absoluto, nem o ser como predicado do Absoluto ou da Ideia — o começo da filosofia é o finito [2], o determinado, o real. O Infinito não pode pensar-se sem o finito. Podes tu pensar, definir a qualidade, sem pensar numa qualidade determinada? Por conseguinte, o primeiro não é o indeterminado mas o determinado, pois a qualidade determinada nada mais é do que a qualidade real; a qualidade real precede a qualidade pensada.

A origem e o movimento subjetivos da filosofia são também o seu movimento e origens objetivos. Antes de pensares a qualidade, sentes a qualidade. A afecção precede o pensamento.

O infinito é a verdadeira essência do finito — o finito verdadeiro. A especulação ou filosofia verdadeira nada mais é do que a empiria verdadeira e universal.

O infinito da religião e da filosofia é e nunca foi mais do que algo de finito, determinado, mas mistificado, isto é, um ser finito e determinado, com o postulado de nada ser de finito, de determinado. A filosofia especulativa tornou-se culpada do mesmo erro que a teologia — ter feito das determinações da realidade ou da finidade determinações e predicados do Infinito só mediante a negação da determinidade, em que elas são o que são.

A honestidade e a probidade são úteis em todas as coisas — também na filosofia. Mas a filosofia só é honesta e sincera quando confessa a finitude da sua infinidade especulativa — quando confessa, por exemplo, que o segredo da natureza em Deus nada mais é do que o segredo da natureza humana, que a noite que ela põe em Deus, para daí tirar a luz da consciência, é unicamente o seu próprio sentimento obscuro, instintivo, da realidade e indispensabilidade da matéria.

O caminho até agora seguido pela filosofia especulativa, do abstrato para o concreto, do ideal para o real, é um caminho invertido. Neste caminho, nunca se chega à realidade verdadeira e objetiva, mas sempre apenas à realização das suas próprias abstrações e, por isso mesmo, nunca à verdadeira liberdade do espírito; pois só a intuição das coisas e dos seres na sua realidade objetiva é que liberta e isenta o homem de todos os preconceitos. A passagem do ideal ao real tem o seu lugar apenas na filosofia prática.

A filosofia é o conhecimento do que é. Pensar e conhecer as coisas e os seres como são — eis a lei suprema, a mais elevada tarefa da filosofia.

O que é, pois, tal como é — portanto, o verdadeiro na sua verdadeira expressão, parece superficial; o que é, expresso tal como não é — portanto, o verdadeiro expresso sem verdade e de modo inverso, parece ser profundo.

A veracidade, a simplicidade, a exatidão são as características formais da filosofia real.

O ser, com que a filosofia começa, não se pode separar da consciência nem a consciência se pode separar do ser. Assim como a realidade da sensação é a qualidade e, inversamente, a sensação é a realidade da qualidade, assim também o ser é a realidade da consciência, mas, inversamente, a consciência é a realidade do ser — só a consciência é o ser efetivamente real. A unidade real de espírito e natureza é tão-só a consciência.

Todas as determinações, formas, categorias, ou como se quiser chamá-las, que a filosofia especulativa eliminou do Absoluto e rejeitou para o âmbito do finito, do empírico, contêm justamente a essência verdadeira do finito, o verdadeiro infinito, os verdadeiros e últimos mistérios da filosofia.

O espaço e o tempo são as formas de existência de todo o ser. Só a existência no espaço e no tempo é existência. A negação do espaço e do tempo é sempre apenas a negação dos seus limites, não do seu ser. Uma sensação intemporal, uma vontade intemporal, um pensamento intemporal, um ser intemporal são quimeras. Quem não tem tempo algum também não tem em geral tempo nem impulso para querer e pensar.

A negação do espaço e do tempo na metafísica, na essência das coisas, tem as mais funestas consequências práticas. Só quem em toda a parte se encontra no ponto de vista do tempo e do espaço possui igualmente na vida tato e entendimento prático. O espaço e o tempo são os primeiros critérios da práxis. Um povo que exclui o tempo da sua metafísica e diviniza a existência eterna, isto é, abstrata, isolada do tempo, exclui também consequentemente o tempo da sua política e diviniza o princípio da estabilidade, contrário ao direito, à razão, à história.

A filosofia especulativa fez do desenvolvimento sem o tempo uma forma, um atributo do Absoluto. Mas esta separação do desenvolvimento e do tempo é uma verdadeira obra-prima da arbitrariedade especulativa e a prova irrefutável de que os filósofos especulativos utilizaram o seu Absoluto, como os teólogos utilizaram o seu Deus, o qual, sem afeto, tem todos os afetos do homem, ama sem amor, irrita-se sem irritação. Um desenvolvimento sem tempo equivale a um desenvolvimento sem desenvolvimento. A proposição: o Ser absoluto evolui a partir de si — é, ao fim e ao cabo, verdadeira e racional só quando invertida. Importa pois dizer: só um ser que se desenvolve e se desdobra no tempo é um Ser absoluto, isto é, verdadeiro e real.

O espaço e o tempo são as formas de revelação do Infinito real.

Onde não existe nenhum limite, nenhum tempo, nenhuma aflição, também não existe nenhuma qualidade, nenhuma energia, nenhum espírito, nenhuma chama, nenhum amor. Só o ser indigente é o ser necessário. A existência sem necessidades é uma existência supérflua. O que é em geral isento de necessidades também não tem qualquer necessidade da existência. Quer ele seja, ou não, é tudo um — um para si mesmo, um para os outros. Um ser sem indigência é um ser sem fundamento. Só merece existir o que pode sofrer. Só o ser doloroso é um ser divino. Um ser sem afecção é um ser sem ser. Mas um ser sem afecção nada mais é do que um ser sem sensibilidade, sem matéria.

Uma filosofia que não tenha em si qualquer princípio passivo; uma filosofia que especula sobre a existência sem tempo, sobre a existência sem duração, sobre a qualidade sem sensação, sobre o ser sem ser, sobre a vida sem vida, sem carne e sangue — uma tal filosofia, como a filosofia do Absoluto em geral, tem necessariamente como seu contrário, na sua unilateralidade plena, a empiria. Espinosa fez da matéria um atributo da Substância, não porém como um princípio de afecção, mas justamente porque ela não sofre, porque é única, indivisível e infinita, porque possui exatamente as mesmas determinações que o seu contrário, o atributo do pensamento, em suma, porque é uma matéria abstrata, uma matéria sem matéria, da mesma maneira que a essência da lógica hegeliana é a essência da natureza e do homem, mas sem essência, sem natureza, sem homem.

O filósofo deve introduzir no texto da filosofia aquilo que no homem não filosofa, aquilo que, pelo contrário, é contra a filosofia, que se opõe ao pensamento abstrato, portanto, aquilo que em Hegel se reduz a simples nota. Só assim a filosofia se tornará a força universal, sem antagonismos, irrefutável e irresistível. A filosofia não deve, pois, começar por si, mas pela sua antítese, pela não filosofia. Esta essência distinta do pensamento, afilosófica, absolutamente antiescolástica em nós, é o princípio do sensualismo.

Os instrumentos e os órgãos essenciais da filosofia são a cabeça, fonte da atividade, da liberdade, da infinidade metafísica, do idealismo, e o coração, fonte da afecção, da finitude, da necessidade, do sensualismo — em termos teóricos: o pensamento e a intuição, pois o pensamento é a necessidade da cabeça; a intuição e o sentido são a necessidade do coração. O pensamento é o princípio da escola, do sistema; a intuição é o princípio da vida. Na intuição, sou determinado pelo objeto; no pensamento, sou eu que determino o objeto; no pensamento, eu sou eu, na intuição, não-eu. Só a partir da negação do pensamento, a partir do ser determinado pelo objeto, a partir da paixão, a partir da fonte de todo o prazer e necessidade se produz o pensamento verdadeiro e objetivo, a filosofia verdadeira e objetiva. A intuição dá a essência imediatamente idêntica à existência, o pensamento proporciona a essência mediatizada pela distinção, a separação da existência. Portanto, só onde a existência se une à essência, a intuição ao pensamento, a passividade à atividade, só onde o princípio antiescolástico e sanguíneo do sensualismo e do materialismo franceses se une à fleuma escolástica da metafísica alemã é que se encontra a vida e a verdade.

Tal filosofia, tal filósofo e, inversamente: as propriedades do filósofo, as condições e os elementos subjetivos da filosofia são também as suas condições e os seus elementos objetivos. O verdadeiro filósofo, um só com a vida e com o homem, deve ser o filósofo de sangue galo-germânico. Não desmaieis, ó castos alemães, perante este cruzamento! Já no ano de 1716 exprimiram este pensamento as Acta Philosophorum. “Se compararmos os Alemães e os Franceses, descobrimos nos franceses mais vivacidade nos seus ingenia, mas mais solidez nos alemães, e poderia com razão afirmar-se que o temperamento que melhor convém à filosofia é o gálico-germânico, ou ainda que uma criança que tivesse um francês por pai e uma alemã por mãe deveria (caeteris paribus) ser dotada de um bom ingenium philosophicum.” Inteiramente correto; só que agora devemos fazer da mãe uma francesa e do pai um alemão. O coração — o princípio feminino, o sentido do sensível, a sede do materialismo — é de inspiração francesa; a cabeça — o princípio masculino, a sede do idealismo — é de inspiração alemã. O coração faz revoluções, a cabeça reformas; a cabeça põe as coisas em posição, o coração põe-nas em movimento. Mas só onde existe movimento, efervescência, paixão, sangue, sensibilidade, reside também o espírito. Só o esprit de um Leibniz, o seu princípio sanguíneo, materialista-idealista, arrancou pela primeira vez os Alemães ao seu pedantismo e ao seu escolasticismo filosóficos.

O coração constituiu até agora na filosofia o baluarte da teologia. Mas o coração é justamente, no homem, o princípio puramente antiteológico, o princípio descrente, ateu, no sentido da teologia. Pois crê somente em si mesmo, crê apenas na realidade irrecusável, divina, absoluta, da sua própria essência. Mas a cabeça, que não compreende o coração — porque a sua função consiste em separar, em distinguir o sujeito e o objeto — transforma a essência própria do coração numa essência distinta do coração, objetiva e exterior. O coração tem, decerto, necessidade de um outro ser, mas apenas de um ser que lhe seja semelhante e não diferente do coração, e que também não o contradiga. A teologia nega a verdade do coração, a verdade da paixão religiosa. A paixão religiosa, o coração, diz, por exemplo: “Deus sofre”; a teologia, pelo contrário, afirma: “Deus não sofre”; ou seja, o coração nega a distinção entre Deus e o homem, a teologia afirma-a.

O teísmo baseia-se no conflito entre a cabeça e o coração; o panteísmo é a supressão desta cisão na cisão — pois torna imanente o ser divino apenas como transcendente —; o antropoteísmo é a supressão da cisão sem cisão. O antropoteísmo é o coração elevado a entendimento; exprime na cabeça apenas de maneira racional o que o coração diz a seu modo. A religião é apenas afecção, sentimento, coração, amor, isto é, a negação e dissolução de Deus no homem. Por conseguinte, a nova filosofia, enquanto negação da teologia, que nega a verdade da paixão religiosa, é a posição da religião. O antropoteísmo é a religião autoconsciente — a religião que a si mesma se compreende. A teologia, pelo contrário, nega a religião sob a aparência de a pôr.

Schelling e Hegel são contrários. Hegel representa o princípio masculino da independência, da autoatividade, numa palavra, o princípio idealista; Schelling, o princípio feminino da receptividade, da passividade; — primeiro foi inspirado por Fichte, depois por Platão e Espinosa, finalmente por J. Böhme — numa palavra, o princípio materialista. Hegel carece de intuição, Schelling de força de pensamento e de determinação. Schelling é pensador só no universal; mas quando vem às coisas, ao particular e ao determinado, cai no sonambulismo da imaginação. Em Schelling, o racionalismo é apenas aparência, o irracionalismo é a verdade. Hegel chega apenas a uma existência e a uma realidade abstratas, que contradizem o princípio irracional; Schelling chega tão-só a uma existência e a uma realidade místicas e imaginárias, que contradizem o princípio racional. Hegel compensa a sua carência de realismo por um vocabulário grosseiramente concreto, Schelling, por belas palavras. Hegel exprime o extraordinário em termos ordinários, Schelling, exprime o comum em termos incomuns. Hegel transforma as coisas em puros pensamentos, Schelling transforma puros pensamentos — por exemplo, a asseidade de Deus — em coisas. Hegel engana as cabeças que pensam, Schelling, pelo contrário, muda a razão em não-razão. Schelling é a filosofia da realidade em sonho, Hegel é a filosofia da realidade já em conceito. Schelling nega o pensamento abstrato na fantasia, Hegel nega-o no pensamento abstrato. Enquanto autonegação do pensamento negativo, enquanto plena realização da antiga filosofia, Hegel é o começo negativo da nova; Schelling é a antiga filosofia com a presunção e a ilusão de ser a nova filosofia da realidade.

A filosofia hegeliana é a supressão da contradição do pensamento e do ser, como a exprimiu particularmente Kant, mas, cuidado!, é apenas a supressão desta contradição no interior da contradição — no interior de um só e mesmo elemento — no seio do pensamento. Em Hegel, o pensamento é o ser; — o pensamento é o sujeito, o ser é o predicado. A lógica é o pensamento num elemento do pensamento, ou pensamento que a si mesmo se pensa, — o pensamento como sujeito sem predicado ou o pensamento que é simultaneamente sujeito e o seu próprio predicado. Mas o pensamento no elemento do pensamento é ainda algo de abstrato; por isso, realiza-se e aliena-se. Este pensamento realizado e alienado é a natureza, o real em geral, o ser. Mas, qual é o verdadeiro real neste real? É o pensamento — que bem depressa se despoja do predicado da realidade para, de novo, estabelecer a sua falta de predicados como sua essência verdadeira. Mas, justamente por isso, Hegel não chegou ao ser como ser, ao ser livre, independente, feliz em si mesmo. Hegel pensou unicamente os objetos como predicados do pensamento que a si mesmo se pensa. A contradição assim admitida entre a religião existente e a religião pensada na filosofia hegeliana da religião deve-se apenas a que, aqui, como noutros lugares, o pensamento se transforma em sujeito, e o objeto — a religião — num simples predicado do pensamento.

Quem não abandonar a filosofia hegeliana, não abandona a teologia. A doutrina hegeliana de que a natureza é a realidade posta pela Ideia é apenas a expressão racional da doutrina teológica, segundo a qual a natureza é criada por Deus, o ser material por um Ser imaterial, isto é, um ser abstrato. No final da Lógica, leva mesmo a Ideia absoluta a uma “decisão” nebulosa para documentar, por sua própria mão, a sua extração do céu teológico.

A filosofia hegeliana é o último lugar de refúgio, o último suporte racional da teologia. Assim como outrora os teólogos católicos se tornaram efetivamente aristotélicos, para poderem combater o protestantismo, assim também agora devem, por direito, os filósofos protestantes tornar-se hegelianos para poderem combater o “ateísmo”.

A verdadeira relação entre pensamento e ser é apenas esta: o ser é o sujeito, o pensamento, o predicado. O pensamento provém do ser, mas não o ser do pensamento. O ser existe a partir de si e por si — o ser é só dado pelo ser. O ser tem o seu fundamento em si mesmo, porque só o ser é sentido, razão, necessidade, verdade, numa palavra, tudo em todas as coisas. — O ser é, porque o não ser é não ser, isto é, nada, não-sentido.

A essência do ser enquanto ser é a essência da natureza. A gênese temporal estende-se apenas às formas, não é essência da natureza.

O ser só pode derivar-se do pensamento onde se rompeu a verdadeira unidade de pensamento e ser, onde primeiro se tirou por abstração ao ser a sua alma, a sua essência e, em seguida, logo se reencontra nesta essência abstraída do ser o sentido e o fundamento deste ser vazio por si mesmo; da mesma maneira que só se deduz e se deve deduzir o mundo a partir de Deus, onde arbitrariamente se isola do mundo a essência do mundo.

Quem especula em busca de um particular princípio de realidade da filosofia, como fazem os chamados filósofos positivos,

É como um animal em terra árida
Que um mau espírito faz rodopiar,
E em torno há belas pastagens verdes.

Estas belas e verdes pastagens são a natureza e o homem, pois ambos se confundem. Contemplai a natureza, contemplai o homem! Aqui tendes vós, diante dos olhos, os mistérios da filosofia.

A natureza é a essência que não se distingue da existência, o homem é a essência que se distingue da existência. A essência não distinta é o fundamento da essência que distingue — a natureza é, pois, o fundamento do homem.

A nova, a única filosofia positiva, é a negação de toda a filosofia de escola, embora dela contenha em si a verdade, é a negação da filosofia como qualidade abstrata, particular, isto é, escolástica: não possui nenhum santo-e-senha, nenhuma linguagem particular, nenhum nome particular, nenhum princípio particular; ela é o próprio homem pensante — o homem que é e sabe que é a essência autoconsciente da natureza, a essência da história, a essência dos Estados, a essência da religião — o homem que é e sabe que é a identidade real (não imaginária), absoluta, de todos os princípios e contradições, de todas as qualidades ativas e passivas, espirituais e sensíveis, políticas e sociais — que sabe que o ser panteísta, que os filósofos especulativos ou, antes, os teólogos separavam do homem, e objetivavam num Ser abstrato, nada mais é do que a sua própria essência indeterminada, mas capaz de infinitas determinações.

A nova filosofia é a negação tanto do racionalismo como do misticismo, tanto do panteísmo como do personalismo, tanto do ateísmo como do teísmo; é a unidade de todas estas verdades antitéticas enquanto verdade absolutamente independente e pura.

A nova filosofia já se expressou quer negativa quer positivamente como filosofia da religião. Basta apenas transformar em premissas as conclusões da sua análise, para nelas reconhecer os princípios de uma filosofia positiva. Mas a nova filosofia não almeja os favores do público. Segura de si mesma, desdenha parecer o que é; mas, precisamente por isso, deve ser o que não é, aos olhos da nossa época, que nos interesses mais essenciais toma a aparência pelo ser, a ilusão pela realidade, o nome pela coisa. Assim se completam os contrários! Onde o nada se toma por algo, a mentira pela verdade, tomar-se-á aí, pois, algo por nada, a verdade pela mentira. E quando — comicamente, no preciso momento em que a filosofia se concebe num ato decisivo e universal de autodesmistificação — se faz a tentativa, até então inaudita, de fundar uma filosofia unicamente no favor e na opinião do público dos jornais, então é preciso também, de modo honesto e cristão, tentar contradizer as obras filosóficas só porque são publicamente difamadas no Augsburger Allgemeine Zeitung. Quão honrosas, quão morais são, pois, as condições da vida pública na Alemanha!

Um novo princípio emerge sempre com um novo nome; isto é, eleva ao estado principesco um nome tirado de uma condição baixa e inferior — e faz dele uma designação do que há de mais elevado. Se se traduzir por “autoconsciência” o nome da nova filosofia, o nome Homem, interpreta-se a nova filosofia no sentido da antiga, desloca-se de novo para o antigo ponto de vista; pois a autoconsciência da antiga filosofia enquanto separada do homem é uma abstração sem realidade. O homem é a autoconsciência.

De acordo com a linguagem, o nome Homem é um nome particular, mas, segundo a verdade, é o nome de todos os nomes. Ao homem são devidos múltiplos predicados. Seja o que for que o homem nomeie ou exprima, expressa sempre a sua própria essência. Por isso, a linguagem é o critério da elevação ou da baixeza do nível da cultura da humanidade. O nome de Deus é apenas o nome daquilo que o homem considera o poder supremo, a essência suprema, isto é, o sentimento supremo e o pensamento supremo.

O nome Homem significa, em geral, apenas o homem com as suas necessidades, sensações, opiniões — o homem enquanto pessoa, distinto do seu espírito e das suas qualidades públicas em geral — o homem distinto, por exemplo, do artista, do pensador, do escritor, do juiz etc., como se a qualidade de pensador, de artista, de juiz etc., não fosse uma propriedade característica e essencial do homem; como se na arte, na ciência e assim por diante, o homem estivesse fora de si. A filosofia especulativa fixou teoricamente a separação entre o homem e as qualidades essenciais do homem e divinizou assim, enquanto essências independentes, qualidades puramente abstratas. Lê-se, por exemplo, no Direito Natural de Hegel, § 190: “No direito o objeto é a pessoa, no ponto de vista moral é o sujeito, na família é o membro da família, na sociedade civil, em geral, é o cidadão (como bourgeois), aqui, do ponto de vista das necessidades, é o concreto da representação (?), que se chama homem: aqui, pois, pela primeira vez, e só aqui, se falará do homem neste sentido.” Neste sentido: por conseguinte, quando se fala do cidadão, do sujeito, do membro da família, da pessoa, trata-se apenas, em verdade, de um só e mesmo ser, do homem, só que num sentido diferente, e com uma qualidade diversa.

Toda a especulação sobre o direito, a vontade, a liberdade, a personalidade sem o homem, fora ou acima do homem, é uma especulação sem unidade, sem necessidade, sem substância, sem fundamento, sem realidade. O homem é a existência da liberdade, a existência da personalidade, a existência do direito. Só o homem é o fundamento e o solo do Eu de Fichte, o fundamento e o solo da mônada leibniziana, o fundamento e o solo do Absoluto.

Todas as ciências se devem fundar na natureza. Uma doutrina é apenas uma hipótese enquanto não se encontrou a sua base natural. Isto vale sobretudo para a doutrina da liberdade. Só a nova filosofia conseguirá naturalizar a liberdade, que até aqui era uma hipótese anti e supranaturalista.

A filosofia deve de novo unir-se à ciência da natureza e a ciência da natureza à filosofia. Esta união, baseada numa necessidade recíproca, numa necessidade interna, será mais duradoura, mais feliz e mais fecunda do que a mésalliance até agora existente entre a filosofia e a teologia.

O homem é a essência fundamental do Estado. O Estado é a totalidade realizada, elaborada e explicitada da essência humana. No Estado, as qualidades ou atividades essenciais do homem realizam-se em “estados” particulares; mas, na pessoa do chefe do Estado, são reconduzidas à identidade. O chefe do Estado deve representar todos os “estados”; diante dele, todos são igualmente necessários e igualmente justificados. O chefe do Estado é o representante do homem universal.

A religião cristã uniu o nome do homem e o nome de Deus sob um só nome, o de Deus-Homem — elevou, pois, o nome do Homem a atributo do Ser supremo: segundo a verdade, a nova filosofia fez deste atributo a substância, e do predicado o sujeito — a nova filosofia é a ideia realizada — a verdade do Cristianismo. Mas precisamente porque contém em si a essência do Cristianismo, abandona o nome do Cristianismo. O Cristianismo exprimiu a verdade unicamente em contradição com a verdade. A verdade sem contradição, pura, liberta de todas as falsificações é uma nova verdade — uma ação nova e autônoma da humanidade.

***

1.Estas designações teológicas utilizam-se aqui apenas no sentido de epítetos triviais.
2.Emprego a palavra “finito” sempre apenas no sentido da filosofia “absoluta”, à qual, do ponto de vista do Absoluto, o real, o efetivo surge como o irreal, o nulo, porque o irreal, o indeterminado constitui para ela o real, embora, por outro lado, de novo do ponto de vista da niilidade, o finito, o nulo apareça como o real — uma contradição que sobressai sobretudo na primeira filosofia de Schelling, mas que subjaz também ainda à filosofia hegeliana.
Nota do Tradutor
O traslado aqui proposto data de 1988, ano em que foi publicado, mas surge agora refeito e modificado em vários pormenores. Na sua base, como se indicou na Apresentação, está a Gesammtausgabe das obras de L. Feuerbach, pronta e realizada por Wilhelm Bolin e Friedrich Jodl.

Autor: Ludwig Feuerbach
Tradução: Artur Morão
Fonte: Lusosofia

sexta-feira, 29 de julho de 2011

É. (N Ã O)PODE SER...

Eurodeputado simpatiza com ideias do terrorista norueguês
Por Redacção

Um eurodeputado italiano, eleito por um dos partidos aliados do primeiro-ministro, Silvio Berlusconi, admitiu esta terça-feira concordar com algumas das ideias do autor dos atentados terroristas na Noruega, exceptuando a violência.
«Algumas das ideias que exprime são boas, retirando a violência, e algumas delas são excelentes», afirmou Mario Borghezio, eurodeputado eleito pela Liga Norte, a uma rádio italiana.

(http://www.abola.pt/mundos/ver.aspx?id=277998)

quinta-feira, 28 de julho de 2011

TEM QUE RIR PARA NÃO CHORAR


 Dois amigos se encontram no bar. Um deles está com um olho preto.
- O que foi que te aconteceu? - pergunta o outro.
- Eu levei um frango congelado na cara, só isso! - responde o amigo.
- Mas como foi que aconteceu isso?
- É que ontem minha mulher estava de mini-saia e ela abaixou no congelador para pegar alguma coisa. Eu estava atrás dela e não resisti, agarrei ela ali mesmo.
- Sério?
- Claro! E ela não queria, se remexia, e eu fiquei com mais tesão ainda, e mais ela gritava, mais eu continuava...
- Pô!
- E ela se debatia como uma louca, e eu cada vez com mais tesão...
- Só estou imaginando a cena! - diz o outro excitado.
- E então, enquanto eu a comia, ela conseguiu pegar um frango congelado e o jogou na minha cara!
- Mas que coisa! Tua mulher não gosta de sexo?
- Em casa sim, no Supermercado não!

terça-feira, 26 de julho de 2011

ANA, ERA UMA VEZ...

 As lebres, as raposas e as águias

Uma vez as lebres se meteram numa guerra longa e feroz com as águias e viram que não iam conseguir vencer suas inimigas se não conseguissem ajuda. Diante disso, foram conversar com as raposas para ver se queriam fazer uma aliança com elas contra as águias. As lebres ficaram felizes quando as raposas responderam educadamente que gostariam muito de ajudá-las em tudo que fosse possível. Só que a alegria das lebres durou pouco, pois as raposas continuaram dizendo, com igual sinceridade, que também eram muito amigas das águias.

Só é possível uma sociedade quando os dois parceiros estão unidos em torno de uma mesma causa.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

REVISÃOZÃO: A MARCHA PARA O OESTE DOS EUA.


 Pioneiros X Índios
Após a Guerra da Secessão, os Estados Unidos entraram numa fase de nítido progresso em todos os setores, particularmente no que diz respeito à sua economia. Este fenômeno, talvez um dos mais prodigiosos da história daquele país, só foi possível graças ao processo a que se deu o nome de "conquista do Oeste", o qual se fez à custa dos territórios índios, que foram sendo ocupados por colonos e soldados e, rapidamente, rasgados pelo caminho de ferro. O comboio, sucessor das caravanas, possibilitará o estabelecimento de grandes explorações agrícolas e ganadeiras e das indústrias mais rentáveis. Os ancestrais ocupantes destas terras não puderam resistir ao avanço do "homem branco", do "cara pálida", e a sua resistência foi inglória.
A expansão territorial dos Estados Unidos da América, no Faroeste, no decurso do século XIX, colidiu, de facto, com os interesses das populações americanas nativas. As populações índias que habitavam na parte norte do continente americano foram confrontadas com a forte oposição dos colonos de origem europeia instalados na ex-colónia britânica.
A "confederação Sioux", um dos grupos populacionais de nativos americanos, foi severamente atingida por esta vaga expansionista. Estes povos, da família etno-linguística Siouan, chamados Nadouessioux pelos franceses e mais tarde Sioux pelos colonos, autointitulados Lakota ou Dakota, reuniam sete povos, que vieram a subdividir-se depois em três: dois de povos agricultores sedentários, os Santee e os Nakota, e um de caçadores, Bufaloteton.
No século XVII, os Sioux do Minnesota viviam da caça de animais, da criação de gado e do arroz selvagem, e encontravam-se cercados por povos inimigos como os Ojibwa, que os arrastou para as planícies de Búfalos nas Grandes Planícies. Aqui tornaram-se caçadores e atingiram grande prosperidade.
Por volta de 1750, contavam-se cerca de 30 mil homens, estabelecidos no coração das Grandes Planícies. Dominaram esta vasta região até ao século seguinte. Os Sioux viviam em comunidades tiyospe, constituídas por um grupo familiar alargado, que viajava em conjunto à procura de caça, e acreditavam num deus omnipotente (Wakan Tanka).
Mais tarde, durante a Guerra da Independência Americana, os Sioux lutaram ao lado dos ingleses, mas, em 1815, alguns grupos do Este firmaram tratados de amizade com os Estados Unidos da América. Em 1825 surgiu outro tratado que confirmou a posse, por parte dos Sioux, de um vasto território nos atuais estados do Minnesota, Dakota doNorte e do Sul, Wisconsin, Iowa, Missouri e Wyoming.
Em 1837 os Sioux venderam o seu território a este do rio Mississípi aos Estados Unidos, e em 1851 outros territórios foram também vendidos.
Por esta altura, estalaram conflitos entre os Sioux e os Americanos. No ano de 1854, perto de Fort Laramie no Wyoming, foram mortos 19 soldados americanos. Em 1855, como retaliação deste ato, as tropas americanas mataram por sua vez 100 índios sioux no seu acampamento de Nebraska e prenderam o seu líder.
Entre 1866 e 1867 rebentou a Red Cloud's War (Guerra de Nuvem Vermelha), um conflito com o nome do chefe sioux, concluída com a celebração de um tratado perpétuo, firmado em Black Hill. Apesar deste acordo teoricamente perpétuo, os norte-americanos desrespeitaram as condições do tratado, e em 1870 os índios confrontavam-se com a chegada de inúmeros colonos atraídos pelo ouro.
Na sequência desta "corrida ao ouro", a nação sioux "desenterrou o machado de guerra" e após uma aliança com algumas tribos cheyennes e shoshones, entre outras, organizou ataques contra os Americanos. O culminar deste processo bélico ocorreu no dia 25 de junho de 1876, quando os "bravos" chefiados por Sitting Bull (Touro Sentado) esmagaram o Sétimo Regimento de Cavalaria na batalha de Little Big Horn, no Wyoming. Neste combate pereceu o general Custer, uma das mais destacadas figuras do Exército norte-americano, responsável pelo massacre dos Cheyennes recolhidos na reserva de Wichita, alguns anos antes deste conflito.
Depois destes acontecimentos, os Sioux separaram-se. Mas em Wounded Knee, em dezembro de 1890, foram surpreendidos pelas tropas americanas, que dizimaram cerca de 200 índios. Este facto marca o fim da resistência deste povo.
Os seus descendentes vivem hoje nas reservas nos estados americanos do Minnesota, Dakota do Norte e Dakota do Sul, em Montana e no Nebraska, mantendo a sua língua nativa e dialetos.
Os Cheyennes são também um povo nativo americano, da família linguística Alonquian. Este povo de agricultores e caçadores fixou-se, no século XVII, no centro do estado do Minnesota, afastado das áreas dos Sioux e dos Ojibwas. Posteriormente, foram-se deslocando ao longo do rio no Dakota do Norte.
Em 1770, o seu acampamento foi destruído pelos Ojibwas, obrigando-os a mudarem-se para sul. Quando atingiram Black Hills, no Dakota do Sul, passaram a depender dos búfalos, e adotaram um modo de vida nómada, caçando e praticando uma agricultura rudimentar, sem esquecer a sua vocação bélica. A prática da Sun dance (dança do Sol) estava integrada numa religião que dava grande importância às experiências visionárias.
O cavalo, que para aqui terá sido trazido cerca de 1750, ajudou-os a tornarem-se uma das tribos índias mais fortes das planícies do Oeste.
Por volta de 1830 dividiram-se em dois grupos: os Cheyennes do Sul, da parte superior do rio Arkansas, e os Cheyennes do Norte, no Platte River. Na década seguinte (1864) surgiram os problemas com as forças militares americanas, quando estas massacraram um grupo de Cheyenne em Sand Creek, no Colorado (reserva de Wichita).
A resposta dos Cheyennes foi dada em 1876. Como já foi referido, nesse ano juntaram-se aos Sioux e derrotaram as forças americanas do general Custer na batalha de Little Big Horn. Depois deste acontecimento renderam-se, e foram recolocados pelo Governo americano num território índio, hoje pertença do Estado do Oklahoma, onde vieram a sofrer de doenças e fome.
Os Comanches eram um povo nativo do braço meridional do Shoshones, da Uto-Aztecan, uma família linguística da área cultural das Planícies. Este povo deixou a sua terra tradicional das áridas Montanhas Rochosas e mudou-se para o Sul das Grandes Planícies no século XV, expulsando o povo apache. Dominavam uma vasta área no século XVIII e parte do século XIX, que se estendia até ao México. Em 1800 eram 30 mil. No entanto, uma epidemia reduziu-os a cerca de 10 mil indivíduos.
Eram um povo nómada, caçador de bisontes, que vivia em tendas, numa sociedade de grupos patrilineares. Os Comanches usavam tatuagens e vestes muito exuberantes e acreditavam em espíritos.
Eram um povo muito ligado ao cavalo, sobretudo ao cavalo da raça Pinto Ponies, adquirida aos Espanhóis, e que depois eles próprios passaram a criar. Esta relação com esta espécie animal relacionava-se com a sua vocação para a guerra. Os Comanches atacavam não só as populações de colonos americanos, mas também os outros povos índios.
Em 1875 fizeram a paz com os Estados Unidos.
Os índios Kiowas, outro povo nativo americano, pertencem à família linguística Kiowan-Tanoan, da área cultural das Grandes Planícies. Originalmente, viviam ao longo do rio Arkansas e dos rios vizinhos, numa região hoje pertencente aos estados do Colorado, do Novo México e do Oklahoma. Este povo, todavia, afastava-se um pouco dessa cultura Kiowan-Tanoan, não deixando, no entanto, de ser também muito belicoso e composto por exímios caçadores, apresentando uma elaborada estrutura militar.
Curiosamente, estiveram muito perto de uma língua escrita. Os Kiowas dispunham de sinais pictográficos usados em calendários e no registo de dados cronológicos e eventos relevantes.
Após o período de guerra com os Europeus e com o Exército dos Estados Unidos chefiada por George A. Custer, em 1868, foram forçados a viver numa reserva no Oklahoma em 1874. Todavia, conseguiram fugir e retomaram a sua luta contra os seus vizinhos americanos até 1875. Regressaram ao Oklahoma e aí se fixaram para mais tarde, em 1901, ganharem a cidadania americana.

KAGAN, Robert. Dangerous Nation – America’s Foreign Policy From Its Earliest Days to the Dawn of the Twentieth Century. Nova York, Vintage, 2006.
MCPHERSON, James M. Battle Cry of Freedom – The American Civil War. Londres, Penguin, 1990.
Mellander, Gustavo A.; Nelly Maldonado Mellander (1999). Charles Edward Magoon: The Panama Years. Río Piedras, Puerto Rico: Editorial Plaza Mayor. ISBN 1563281554. OCLC 42970390.
Mellander, Gustavo A. (1971). The United States in Panamanian Politics: The Intriguing Formative Years. Danville, Ill.: Interstate Publishers. OCLC 138568.
SELLERS, Charles, MAY, Henry e MCMILLAN, Neil R. Uma Reavaliação da História dos Estados Unidos. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1990.

domingo, 24 de julho de 2011

PENSANDO NUMA BOA SEMANA

 "Não devemos permitir que alguém saia de nossa presença sem se sentir melhor e mais feliz."
(Madre Teresa de Calcutá)

sábado, 23 de julho de 2011

PHISOLOFANDO

 11. Em filosofia, entende-se por pré-socráticos aqueles filósofos que antecederam a Sócrates. Entre as opções abaixo relacionadas identifique-os:
a) Tales de Mileto / Santo Agostinho / Heráclito;
b) Parmênides / Anaximandro / Diógenes;
c) Parmênides / Pitágoras / Aristóteles;
d) Anaxágoras / Platão / Demócrito.

12. A estrutura do mundo das idéias constituída por multiplicidade, porém, distintas do sensível e do inteligível foi concebida por:
a) Sócrates;
b) Kant;
c) Platão;
d) Aristóteles.

13. O método dialético utilizado por Sócrates, identificado como maiêutica, tem como principal fundamento:
a) A ética e a educação;
b) A política e a moral;
c) A religião e os costumes;
d) A lógica e a essência do homem.

14. Compreendendo ser o conhecimento sensível das coisas, enganador, devendo por isso ser superado pela razão, a quem se atribui a autoria do fragmento abaixo transcrito?
"Os (porcos) alegram-se na lama (mais do que na água limpa)"
a) Xenófanes;
b) Heráclito;
c) Leucipo de Abdera;
d) Pitágoras.

15. O poema de Parmênides de Eléia é tido como a doutrina mais profunda do pensamento pré-socrático, de difícil interpretação, sendo composto de três partes distintas a saber:
a) O prólogo / o caminho do saber / o caminho da verdade;
b) O prólogo / o caminho do sensível / o caminho das idéias;
c) O prólogo / o caminho do natural / o caminho da razão;
d) O prólogo / o caminho da verdade / o caminho da opinião.

16. Qual é o filosófo pré-socrático que faz da multiplicidade o principal objeto do seu pensamento, assim manifestando-se acerca da natureza do múltiplo: "em cada coisa há uma coisa porção de cada coisa. Exceção é o Espírito, que é ilimitado e autônomo: ao contrário das coisas, não é misturado com nada."?
a) Zenão de Eléia;
b) Parmênides;
c) Anaxágoras;
d) Tales de Mileto.

17. Entre os principais nomes da filosofia medieval encontra-se o de Giordano Bruno. Sendo sua teoria semelhante à de Nicolau de Cusa e a de Copérnico, qual a razão de ter incomodado tanto a Igreja, fazendo esta oposição radical ao filósofo, a ponto de ser julgado pela inquisição e sumariamente condenado à morte?
a) Acreditar em Deus como um Ser não transcendente;
b) Ter apenas afirmado ser o sol o centro do universo;
c) Duvidar do mistério da Santíssima Trindade como dogma de fé;
d) Inaugurar as possibilidades da construção de um novo conhecimento científico para o mundo.

18. O renascimento apresenta a sua originalidade em razão:
a) Da aceitação de uma nova imagem do mundo, porém com a coexistência valorativa de elementos do passado;
b) Da impossibilidade de crença pelo desprezo e ruptura com o mundo medieval, centrado na divindade, face a nova concepção da valorização do poder criativo do homem;
c) Não aceitação de ser o artista, pintor que reproduz a natureza sobre a tela, como semelhante ao Demiurgo de Platão;
d) Não reconhecimento da necessidade de intermediários na comunicação com Deus, sendo apenas o homem responsável pelos seus próprios atos, sua consciência e pela divindade.

19. São Thomaz de Aquino aponta cinco caminhos para se provar à existência de Deus. Nas alternativas abaixo elencadas identifique a opção correta:
a) A fé e a coerência;
b) A razão e a religião;
c) A natureza e a metafísica;
d) A mutação e a contingência.

20. Na concepção aristotélica o fim supremo do homem é a felicidade. Para o filósofo o que ela significa?
a) A honra moral;
b) O aperfeiçoar-se enquanto homem;
c) O acúmulo de riquezas materiais;
d) O prazer e o gozo das coisas.

21. A metafísica de Aristóteles apresenta três grandes ramos: as ciências teóricas, as práticas e as poéticas. Entre as suas diversas definições compreende o filósofo que a metafísica indaga vários aspectos, entre os quais se inclui:
a) Deus e a substância supra-sensível;
b) Apenas os fenômenos naturais e os princípios supremos;
c) O homem e o ser enquanto ser;
d) Somente a transcendência divina e a realidade física.

22. Tratando da estrutura da temporalidade Santo Agostinho preceitua que o tempo manifesto em presente do passado (memória), presente do presente (intuição) e passado do futuro (espera) tem ligação com o movimento. Entre as alternativas abaixo escolha a opção correta:
a) Está no movimento propriamente dito;
b) Está nas coisas em movimento;
c) Está na alma, por ser-lhe uma extensão;
d) Está no movimento e nas coisas em movimento.

23. Marx escreveu o livro intutado Crítica da Economia Política. Embora sendo um livro dedicado à economia, teve como núcleo fundamental o desvendamento da economia científica burguesa, com foco na exploração do homem pelo homem. Nesse sentido conceitua o que seja a teoria da mais valia, devendo a mesma ser identificada pelas opções abaixo apresentadas.
a) O trabalhador ao trocar-se por um salário torna-se mercadoria;
b) O salário recebido pelo trabalhador e o que produz é de justa correspondência;
c) O valor do trabalhador enquanto mercadoria produtiva não agrega valor ao produto;
d) Diferença entre o valor da força de trabalho, que corresponde a manutenção do operário e o valor que este produz.

24. O positivismo defendido por Augusto Comte teve como crença o progresso tecnológico, somando esforços para tornar o homem consciente de seu destino histórico, tendo como pano de fundo principal:
a) A reforma moral da sociedade;
b) A mudança da estrutura educacional do Estado;
c) A organização dos diversos saberes;
d) A redefinição da metodologia de produção industrial.

25. Com Maquiavel inicia-se uma nova época do pensamento político. Dentre as suas obras tem-se como a de maior referência "O príncipe". Dos seus escritos pode-se compreender como ideal político de Maquiavel:
a) A constituição da República romana, baseada na liberdade e nos bons costumes;
b) A manutenção do poder político pela aplicação de remédios extremos a males extremos, pelos governantes , a fim de evitar o meio termo este de extremo dano a quem governa;
c) Descobrir, através da história, qual a maneira mais adequada para se ganhar os principados, sobretudo os eclesiásticos, como devem eles ser mantidos e como são perdidos pelos príncipes no poder;
d) Criar uma filosofia política em que os fins justificam os meios, sem a preocupação de saber se tais meios são considerados bons ou maus.

26. Descartes é considerado como sendo o filósofo criador do método científico, sendo este formulado por regras diversas, abaixo elencadas. Identifique qual delas é considerada, pelo filósofo, como sendo o ponto de partida e o ponto de chegada de qualquer experiência metodológica.
a) A decomposição do conjunto em seus elementos simples;
b) A divisão do todo de cada problema em tantas partes menores quanto necessárias para melhor resolvê-lo;
c) Fazer enumerações completas e revisões gerais, com a certeza de não haver omitido absolutamente nada;
d) A evidência de que não se deve acatar jamais como verdadeiro aquilo que não se reconhece como evidência.

GABARITO:
11 - B
12 - C
13 - A
14 - B
15 - D
16 - C
17 - A
18 - D
19 - D
20 - B
21 - A
22 - C
23 - D
24 - A
25 - A
26 - D
(Prefeitura Municipal de Cruzeta - Rio Grande do Norte - 2010)

sexta-feira, 22 de julho de 2011

É. PODE SER...

 Grampos ilegais: Primeiro-ministro britânico é vaiado na Câmara
David Cameron, foi ao Parlamento ontem para esclarecer suas ações e envolvimento com o escândalo de escutas ilegais e propinas a policiais

O primeiro-ministro britânico, David Cameron, foi ao Parlamento ontem para esclarecer suas ações e envolvimento com o escândalo de escutas ilegais e propinas a policiais feitas pelo extinto tabloide News of the World, controlado pela empresa News Corp, do magnata Rupert Murdoch. Cameron fez uma declaração acompanhada de muitas vaias dos parlamentares na Câmara dos Comuns, que forçaram o presidente da Casa a interromper o primeiro-ministro e pedir silêncio.
O momento mais tenso foi quando Cameron explicou a contratação de Andy Coulson, ex-editor do tabloide na época das escutas, para ser seu diretor de Comunicações e porta-voz. Coulson é suspeito de ter aprovado o uso das escutas ilegais e o pagamento de propina aos policiais por seus jornalistas em troca de informação exclusiva. Cameron defendeu o bom trabalho de Coulson como seu porta-voz e disse que não houve nenhuma reclamação da forma como trabalhava à época. Ele disse que acredita que as pessoas são inocentes até que se prove o contrário.
(http://www.correio24horas.com.br/home/)

quinta-feira, 21 de julho de 2011

TEM QUE RIR PARA NÃO CHORAR

 Um bêbado entra num bar cambaleando muito, chega pro dono do bar e o desafia:
- Quer apostar cinquenta reais que eu mijo no copo sem deixar cair uma gota no chão?
O dono do bar rindo aceita a aposta. O bêbado mija, mais fora do copo do que dentro e o dono do bar se acabando de rir exclama:
- Tá vendo que você não consegue, me passa os cinquenta pra cá!
O bêbado feliz da vida paga com satisfação. O dono do bar fica intrigado com sua atitude e pergunta:
- Você perdeu cinquenta reais e ainda fica feliz?
O bêbado responde:
- É que eu apostei cento e cinquenta reais com meus camaradas do outro lado da rua que eu mijaria seu bar todinho e você ainda daria risada!

quarta-feira, 20 de julho de 2011

FELIZ DIA DO AMIGO!


  Difícil querer definir amigo.

É aquele que entende seu desejo de voar, de sumir devagar, a angústia

pela compreensão dos acontecimentos, a sede pelo "por vir". É ao mesmo tempo espelho que te reflete, e óleo derramado sobre suas águas agitadas. É quem fica enfurecido por enxergar seu erro, querer tanto o seu bem e saber que a perfeição é utopia. É o sol que seca suas lágrimas, é a polpa que adocica ainda mais seu sorriso.

Amigo é aquele que toca na sua ferida numa mesa de chopp, acompanha suas vitórias, faz piada amenizando problemas. É quem tem medo, dor, náusea, cólica gozo, igualzinho a você. É quem sabe que viver é ter história pra contar. É quem sorri pra você sem motivo aparente, é quem sofre com seu sofrimento, é o padrinho filosófico dos seus filhos. É o achar daquilo que você nem sabia que buscava.

Amigo é aquele que te lê em cartas esperadas ou não, pequenos bilhetes em sala de aula, mensagens eletrônicas emocionadas. É aquele que te ouve ao telefone mesmo quando a ligação é caótica, com o mesmo prazer e atenção que teria se tivesse olhando em seus olhos.

Amigo é multimídia. Olhos....

Amigo é quem fala e ouve com o olhar, o seu e o dele em sintonia telepática. É aquele que percebe em seus olhos seus desejos, seus disfarces, alegria, medo. É aquele que aguarda pacientemente e se entusiasma quando vê surgir aquele tão esperado brilho no seu olhar, e é quem tem uma palavra sob medida quando estes mesmos olhos estão amplificando tristeza interior. é lua nova, é a estrela mais brilhante, é luz que se renova a cada instante com múltiplas e inesperadas cores que cabem todas na sua íris.

Amigo é aquele que te diz "eu te amo" sem qualquer medo de má interpretação:

Amigo é quem te ama "e ponto".

É verdade e razão, sonho e sentimento.

Amigo é pra sempre, mesmo que o sempre não exista.

( Amigo, um ensaio/Marcelo Batalha)

REFLEXÕES DE BARBEARIA

terça-feira, 19 de julho de 2011

ANA, ERA UMA VEZ...

As árvores e o machado

Um lenhador foi até a floresta pedir às árvores que lhe dessem um cabo para seu machado. As árvores acharam que não custava nada atender ao pedido do lenhador e na mesma hora resolveram fazer o que ele queria. Ficou decidido que o freixo, que era uma árvore comum e modesta, daria o que era necessário. Mas, assim que recebeu o que tinha pedido, o lenhador começou a atacar com seu machado tudo o que encontrava pela frente na floresta, derrubando as mais belas árvores. O carvalho, que só se deu conta da tragédia quando já era tarde demais para fazer alguma coisa, cochichou para o cedro:
- Foi um erro atender ao primeiro pedido que ele fez. Por que fomos sacrificar nosso humilde vizinho? Se não tivéssemos feito isso, quem sabe viveríamos muitos e muitos anos!

Quem trai os amigos pode estar cavando a própria cova.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

REVISÃOZÃO: A INGLATERRA VITORIANA.

Alexandrina Vitória, filha de Vitória Maria Luísa, descendente do duque de Saxe-Coburgo-Saalfeld, e de Eduardo Augusto, duque de Kent, 4.° filho do rei Jorge III, nasceu no Palácio de Kensington, Londres, a 24 de maio de 1819.
A 20 de junho de 1837, com apenas 18 anos, Vitória ascendia ao trono de Inglaterra por morte do seu tio Guilherme IV, que não deixara descendência, dando início ao mais longo reinado da história da Inglaterra e um dos mais famosos, que inclusivamente deu nome a uma era britânica, a Vitoriana.
Quando subiu ao trono, Vitória era uma estranha para os seus súbditos, mas à sua morte tinha construído uma reputação e respeito que extravasava as fronteiras do mundo britânico. De início, Vitória foi guiada, política e socialmente, pelo Primeiro Ministro Whig, William Lamb (1834, 1835-41), 2.° visconde de Melbourne, que manteve sobre ela grande influência até se casar com o seu primo Alberto, Príncipe de Saxe-Coburgo-Gotha, a 10 de maio de 1840.
Até se tornar esposa deste Príncipe, Vitória foi educada pela sua governante de origem alemã, a Baronesa Lehzen, que aos 11 anos a advertira para o facto de ser uma presumível candidata ao trono de Inglaterra. O seu pai, Eduardo Augusto, duque de Kent, o irmão mais novo de Guilherme IV, morrera em 1820 quando ela era ainda uma criança, e a sua mãe, a alemã Vitória Maria Luísa, pouco habilitada a providenciar-lhe uma educação esmerada, deixou a criança entregue aos cuidados da governanta.
O casamento modificou completamente a sua vida, pois trouxe-lhe, ao que parece, mais alegria de viver, apesar de durar apenas até 1861. Nesse ano, o primeiro marido da rainha Vitória morria prematuramente, deixando 9 descendentes e um bom exemplo de vida familiar. O primeiro dos seus filhos, Vitória, veio a ser imperatriz alemã, e o segundo filho o futuro Eduardo VII.
A sua vida familiar repartia-se, para além de Londres, entre a Casa Osborne, na Ilha de Wight (mais para o inverno), e o Castelo de Balmoral (residência estival), na Escócia, comprado em 1852 e reconstruído segundo desenhos de Alberto.
O poder constitucional que detinha era limitado; embora as suas escolhas pessoais influenciassem as resoluções políticas e as escolhas de gabinete, ela não determinava a política. Alberto, que estava sempre a seu lado, particularmente em questões de política externa, usava a sua influência para persuadir Vitória a aceitar a sua versão do monarca ideal.
Os dois estavam em acordo na antipatia que nutriam por Lorde Palmerston e suas políticas, mas não contestaram a sua liderança. Ambos estavam preocupados com a política externa, sobretudo na questão que conduziu à Guerra da Criméia, tendo apoiado a intervenção das tropas britânicas no conflito. Em 1856, a soberana instituiu a condecoração Victoria Cross, para galardoar o militar mais valioso para o seu país, e em 1857 deu a Alberto o título de Príncipe Consorte.
Após a morte do seu marido, Vitória entrou num período de depressão e nervosismo, que deu azo a fortes críticas por parte da opinião pública e das autoridades. A rainha, no entanto, fez prevalecer o seu bom senso e manteve viva a monarquia britânica.
Vitória encontrou em Benjamim Disraeli, um Primeiro Ministro judeu e conservador que destituiu Robert Peel - um homem que o seu falecido muito admirava -, um líder que a encorajou. Foi este homem, Disraeli, que em 1876 convenceu o Parlamento, sobretudo a ala liberal, a passar o Royal Titles Act, conferindo à rainha o título de imperatriz da Índia.
Ao contrário de Benjamim Disraeli, a rainha não tinha grande apreço por um dos mais autoritários líderes liberais do século XIX, William Ewart Gladstone (1809-1898), com quem manteve diversos confrontos institucionais.
Em 1887, celebrou-se um dos mais importantes eventos do seu reinado: o jubileu, comemorativo dos seus 50 anos de reinado. Nesta cerimónia, a rainha compareceu em público, na missa da Ação de Graças na Abadia de Westminster, num evento que ajudou a organizar, e no qual estavam presentes representantes de todas as partes do império.
O Jubileu Dourado, celebrado 10 anos depois foi ainda mais grandioso. Na capela de S. Jorge, em Windsor, para celebrar o dia da Ação de Graças, foi cantado um Te Deum, com música da autoria do príncipe Alberto. Os festejos culminaram quando a rainha premiu um botão elétrico que telegrafou uma mensagem do jubileu para todo o império, tentando manter-se em contacto com as grandes mudanças do seu tempo, apesar de ser muito conservadora.
Entre 1897 e 1901 houve outra ocasião muito especial. Esta ocorreu aquando da visita da rainha à Irlanda em 1900, trinta e nove anos depois da sua última visita ao país. Esta porção europeia do império esteve no centro das políticas britânicas nos dias do Ministro liberal Gladstone. O assunto manteve a sua atualidade no novo século, e mantém-na ainda hoje.
A Guerra dos Bóeres, na África do Sul, iniciada a 12 de outubro de 1899, arrastou consigo uma cadeia de insucessos militares e a oposição da Europa. Tal como no passado, a rainha apoiou os seus exércitos e festejou triunfalmente a quebra do cerco de Ladysmith a 28 de fevereiro de 1900.
No ano de 1901, morreu na sua residência de Osborne, após prolongada doença. Uma das últimas pessoas a visitá-la foi o seu neto Guilherme II, o imperador germânico, que na Primeira Guerra Mundial lideraria a Alemanha contra a Inglaterra. O "kaiser" foi um dos familiares presentes nas pomposas cerimónias fúnebres. Fechava-se um ciclo da história britânica, o da "era vitoriana", e iniciava-se um novo capítulo.


A Colonização Britânica (1788-1914)
O colonialismo europeu moderno, que data do século XV, pode ser dividido em duas grandes fases: a primeira fase iniciada em 1415 e terminada em 1800; a segunda etapa, de 1800 até à II Guerra Mundial. Se no primeiro período as grandes potências coloniais eram Portugal e Espanha, secundadas pela Holanda, França e Inglaterra (por vezes superadas até) que na aventura da expansão chegaram às Índias Orientais (Ásia e África Oriental) e às Américas, no segundo momento porém, a Grã-Bretanha era a mais poderosa potência colonial presente na Ásia, na África e no Pacífico.
Os portugueses foram os pioneiros deste movimento colonial, pois aproveitaram uma conjuntura de estabilidade política conjugada com a sua experiência marítima e o seu privilegiado posicionamento estratégico, para se lançaram nas descobertas, chegando ao continente africano e à Ásia Oriental ainda no século XV.
O principal objetivo dos navegadores e comerciantes portugueses era dominar o comércio das especiarias e, portanto, em vez de montaram colónias, os portugueses fundaram entrepostos comerciais e fortalezas. Em meados do século XVI, o monopólio do comércio oriental foi seriamente ameaçado pelos holandeses e pelos ingleses, que passavam a entrar em competição com Portugal. Os holandeses foram expulsando os portugueses, estabelecendo-se no Cabo da Boa Esperança e, a partir das primeiras décadas do século XVII, controlavam já Java e Ceilão, o atual Sri Lanka. Mais tarde, os ingleses fundavam, na Índia, a Companhia da Índia Oriental, e iniciavam a sua conquista do território em 1757.
A colonização dos territórios americanos por seu turno, resultou da procura de metais preciosos e de novas terras para a agricultura, da necessidade que alguns indivíduos tinham de fugir às perseguições religiosas e do desejo manifestado por outros de converter ao cristianismo as populações autóctones. Aqui, foram fundadas colónias de povoamento, e não entrepostos, embora as colónias mantivessem um comércio em regime de exclusividade com a potência dominante.
No Novo Mundo o grande adversário era a Espanha, que controlava uma considerável parte da América Central e da América do Sul, enquanto aqui Portugal controlava essencialmente o Brasil.
Os portugueses e os espanhóis formavam muitas vezes colónias mistas onde miscisgenavam os europeus com as populações indígenas; os franceses e britânicos, pelo contrário, fundavam colónias "puras", que eliminavam o contacto rácico com as populações autóctones.
Por volta de 1800, as primeiras potências coloniais tinham já entrado em decadência. As colónias espanholas, portuguesas e francesas nas Américas tinham já adquirido, ou estavam prestes a adquirir, a sua independência depois das Guerras Napoleónicas; os holandeses perderam igualmente grande parte das suas possessões neste continente e envolveram-se em relações comerciais ilegais com outras. A Inglaterra também perdeu uma grande parte dos seus territórios na América do Norte, nomeadamente com a independência dos Estados Unidos em 1776, resultante da vitória dos colonos na Guerra Americana da Independência. Contudo, continuava a ser uma forte potência colonial.
A Inglaterra controlava também o território indiano e, por razões estratégicas, mantinha algumas colónias que ocupara no decurso das guerras com outras potências europeias, por exemplo, o Canadá (aos franceses), o Cabo da Boa Esperança e o Ceilão (aos holandeses).
O segundo momento da expansão colonial, pode por sua vez subdividir-se em duas fases: de 1815 a 1880 e de 1880 a 1914. No primeiro período não houve qualquer coerência geográfica nem parecia haver um desejo consciente das potências controlarem e tomarem mais territórios. Parecia mesmo que as atenções se concentravam em interesses nas periferias, já bem estabelecidos. Os colonos ingleses fixados na Austrália embrenhavam-se nos seus territórios periféricos onde procuravam terras e outros recursos rentáveis, enquanto os franceses, por seu turno, colonizavam a Argélia para assegurarem a sua posição num ponto estratégico, enquanto os russos conquistavam a Ásia Central por razões de segurança.
A Inglaterra, no seu domínio colonial, na era vitoriana, dominava a Índia (incluindo o Paquistão e Bangladesh), a Birmânia, a Malásia, a Austrália e Nova Zelândia e arquipélagos do Pacífico, o território africano entre o Cairo e o Cabo, detinha concessões na China, o Canadá e parte das Caraíbas.
De 1880 a 1914, a atuação das potências coloniais foi mais longe, pois neste período completou-se a colonização da África, com a exceção da Etiópia, que resistiu ao insistente assédio da Itália, e de partes da Ásia e do Pacífico.
Em 1914 a rede colonial mundial estava assim completa, e a Inglaterra, era sem dúvida, a maior potência colonial, pois o seu império era o mais vasto e também o mais diversificado. Apesar da supremacia colonial britânica, outras nações se mantinham como importantes forças coloniais. Eram os casos da França, da Bélgica, da Alemanha, de Portugal, dos Estados Unidos da América e do Japão.
O ano de 1914 representa uma viragem no círculo colonial, e marcou o fim do apogeu colonial britânico, durante o qual a Inglaterra se assumira como a incontestada potência colonial entre o final do século XVIII e o início da I Guerra Mundial, como se viu.
Para alguns autores e políticos como Lenine, as motivações desta fase do colonialismo estavam relacionadas com o capitalismo, que criara a necessidade de encontrar matérias primas e o escoamento do seu aumento de capital; para outros, a tónica era dada às razões diplomáticas e estratégicas onde as colónias se comparavam aos peões num jogo de xadrez; outros ainda viam esta expansão como uma evolução natural da expansão do final do século XIX.
O colonialismo moderno ruiu com o surgimento dos grandes conflitos mundiais no século XX. O crescimento de uma consciência nacional nas colónias, o declínio da influência política e militar da Europa e o descrédito das justificações morais para a existência de impérios conduziram definitivamente à queda do imperialismo e à rápida descolonização acelerada depois do fim da II Guerra Mundial.
(www.infopedia.pt)

domingo, 17 de julho de 2011

sábado, 16 de julho de 2011

PHISOLOFANDO

A Filosofia de Wittgenstein
Roger Scruton
l. A Origem da filosofia "Analítica"
Muito se tem escrito nos últimos anos sobre a vida e a filosofia de Ludwig Wittgenstein (1889-
1951). Atualmente, ele é considerado por muitos o filósofo mais importante de nosso século.
Todavia, é difícil enquadrar seu pensamento na história da filosofia, em parte devido à sua
iconoclasta posterior e, em parte, porque, como Frege, ele parte de reflexões que, à luz dessa
história, podem parecer provincianas e até mesmo desprovidas de qualquer importância
filosófica. Portanto, à guisa de introdução, é necessário dizer algo sobre o estado da filosofia
inglesa quando Wittgenstein veio a se interessar por ela. Tal interesse prenunciou a prolongada
influência que as idéias vienenses vieram a exercer sobre o pensamento angloamericano.
Devemos retroceder um pouco no tempo, até as doutrinas de Russell e Moore.
Bertrand Arthur, terceiro Conde Russell (I872-1970), tem sido até aqui associado à nova lógica,
por ele transformada em poderoso instrumento de análise filosófica. Não menos importante,
historicamente falando, foi seu amigo G. E. Moore (1873-1958), que escreveu importante
tratado sobre ética, o Principia Ethica (I903), e se opôs inexoravelmente a todas as formas de
especulação metafísica que parecessem subverter as verdades estabelecidas do senso comum.
Juntos, Moore e Russell dedicaram-se à demolição das doutrinas do idealismo britânico, como
foram apresentadas por Bradley (em Oxford) e J, M. McTaggart (1866-1925), em sua própria
Universidade de Cambridge. Russell, em sua obra inicial sobre os fundamentos da geometria,
reconhece a influência da Lógica de Bradley. Isso, porém, não o impediu de discernir, na
famosa prova do caráter provisório de objetos e qualidades proposta por Bradley (ver p. 235),
uma confusão entre o "é" da predicação e o "é" da identidade, ou de acusar Bradley e
McTaggart de prestidigitadores em quase todas as provas que ofereceram da inadequação de
nossas concepções de espaço, tempo e matéria baseadas no senso comum. Moore aderiu ao
combate, acrescentando mais asserções peculiarmente dramáticas do que argumentos. Fez a
seguinte pergunta: Como é possível que minha crença de que tenho duas mãos seja menos certa
que a validade de todos os argumentos filosóficos que se têm aduzido para refutá-la? A
combinação da volátil lógica de Russell com a vigorosa recusa de Moore a pensar além de seu
nariz ou de suas mãos mostrou-se extremamente destrutiva, tornando-se moda descrever a
metafísica idealista não como falsa, mas como sem sentido. Outros filósofos - notavelmente
Hume - tinham f eito afirmações semelhantes. No entanto, agora, mais do que nunca, parecia
possível provar o que fora dito, desenvolvendo-se uma teoria da estrutura da linguagem que
mostrasse precisamente o que podia e o que não podia ser dito. E supôs-se que, entre as coisas
que não podiam ser ditas, a metafísica era a mais facilmente reconhecível.
A primeira teoria desse tipo foi o atomismo lógico, prenunciado por Russell e expresso de modo
mais ou menos completo por Wittgenstein, em seu Tractatus Logico-Philosophicus (1921). Essa
obra, que chegou ao ponto de ser mais sucinta que a Monadologia de Leibniz, pretendia
responder de forma definitiva as questões da filosofia. Ao escrevê-la, Wittgenstein inspirou-se,
em parte, na famosa teoria das descrições, proposta por Russell e publicada num artigo que F. P.
Ramsey (I903-1930) descreveu como "paradigma de filosofia". Assim sendo, tal teoria servirá
como introdução adequada à obra de Wittgenstein.

2. A Teoria das Descrições
É estranho, e no entanto verdadeiro, o fato de uma das mais importantes publicações referentes
à filosofia moderna ter tido como objetivo aparente explicar o significado do artigo definido.
Russell pergunta: qual a diferença entre as sentenças "uma montanha de ouro existe" e ``a
montanha de ouro existe"? A primeira expressão é assim explicada pela nova lógica: o
predicado "montanha de ouro" é instanciado ou, de modo mais formal, existe um x tal que x é uma montanha de ouro. Essa proposição é obviamente falsa. Mas que dizer da segunda
proposição? Aqui, a palavra "o" parece transformar o predicado "montanha de ouro" naquilo
que Russell chamaria de expressão denotadora (e que Frege chamou de nome). Trata-se de um
estranho efeito da gramática, que tem uma conseqüência lógica ainda mais estranha, ou seja, a
de que a sentença parece referir-se a alguma coisa - a montanha de ouro. Mas como é isso
possível, se não existe montanha de ouro? Russell alegou que temos aqui um caso
paradigmático de uma forma gramatical que dissimula a forma lógica de uma sentença.
Tomando como exemplo sua própria definição e a implícita definição fregeana de números,
oferece uma definição implícita da palavra "o". Não podemos dizer explicitamente o que o
termo "o" denota, mas podemos mostrar como eliminá-lo de todas as sentenças em que ocorre.
Consideremos a sentença "o Rei da França é calvo". Para que isso seja verdade, deve existir um
rei da França e ele deve ser calvo. Ademais, para apreender o sentido distintivo da palavra "o",
devemos acrescentar que só existe um rei da França. As condições que formam a sentença
verdadeira conferem-lhe o significado; conseqüentemente, podemos dizer que "o Rei da França
é calvo" eqüivale à conjunção de três proposições: "existe um rei da França; tudo que é rei da
França é calvo; e só existe um rei da França''. (Mais formalmente - existe um x tal que x é um rei
da França e x é calvo, e, para todo y, se y é um rei da França, y é idêntico a x.) Essa análise levanos a concluir que, se não existe um rei da França, a sentença original é falsa. A expressão "o
Rei da França", que parecia uma expressão denotadora ou nome, de fato não é tal coisa, mas um
predicado associado a uma alegação existencial oculta. Como Russell assinala, o Rei da França
é uma ficção lógica (Podemos encontrar um antecedente histórico para esse tipo de teoria
filosófica na teoria benthamita das ficções.)
Filosoficamente falando, Russell se opôs a certos fenomenologistas (notadamente, Alexius
Meinong (1853-1920)), que pretenderam concluir que, se podemos pensar em algo como a
montanha de ouro, essa coisa deve, em certo sentido, existir. (Se o leitor não gosta da palavra
"existir', então se oferece outra palavra - "subsistir' - para não ferir suas delicadas
suscetibilidades lógicas.) Russell não chegou a compreender totalmente que Meinong e seus
companheiros se dedicaram menos à investigação da lógica da denotação que ao exame do
"objeto" intencional" do pensamento. Entretanto, seja como for, o argumento de Russell prestase à generalização imediata, proporcionando, nessa forma generalizada, uma base para a
filosofia do Tractatus.

3. 0 atomismo lógico e o Tractatus
De acordo com o Tractatus, tudo que pode ser pensado também pode ser dito. 0s limites da
linguagem são, portanto, os limites do pensamento, de modo que uma completa filosofia do " do
que pode ser dito" será uma teoria completa do que Kant denominara "o entendimento". Todos
os problemas metafísicos decorrem da tentativa de dizer o que não pode ser dito. Uma análise
apropriada da estrutura dos termos utilizados nessa tentativa mostrará tal coisa e, desse modo
solucionará ou diluirá problemas.
Então, qual é a estrutura da linguagem? Wittgenstein dividiu todas as sentenças em complexas e
atômicas, afirmando que as primeiras eram construídas a partir das segundas mediante regras de
formação que podiam ser interpretadas detalhadamente em termos da lógica de Russell. As
sentenças atômicas são aquelas que empregam os primitivos da linguagem` isto é, os nomes e
predicados elementares que, sendo indefiníveis, servem para distinguir (ou "descrever") o que
Wittgenstein chamou de fatos atômicos. Só uma proposição completa pode ser verdadeira ou
falsa e, por conseqüência, só uma proposição completa pode dizer-nos algo sobre o mundo.
Conseqüentemente, o constituinte mais básico do mundo é o que corresponde à sentença
atômica. Esse constituinte básico é o fato atômico, sendo o mundo, portanto, a totalidade de tais
fatos.Os fatos complexos correspondem às proposições complexas e, para compreender tais fatos
complexos, é necessário que compreendamos a complexidade da linguagem usada para
expressá-los. E essa complexidade é inteiramente proporcionada pela lógica fregeana e
russelliana. Assim sendo, "o Rei da França é calvo" é (embora não pareça) uma sentença
complexa, visto que sua verdadeira estrutura (ou seja, sua estrutura como representada pela
nova lógica) mostra que ela consiste em três sentenças incompletas, combinadas e completadas
pela quantificação e pelo conectivo "e". Muitas sentenças assemelham-se a essa. Parecem
básicas, mas, de fato, são complexas. Geralmente, muitas coisas a que nos referimos são
construções lógicas (ou ficções). As sentenças que as descrevem são abreviações de sentenças
mais complexas referentes aos constituintes de fatos totalmente diferentes, porém mais básicos,
em que essas "construções lógicas" não ocorrem. Uma sentença como "um homem médio tem
2,6 filhos" é realmente uma abreviação de uma sentença matemática complexa que relaciona o
número de filhos dos homens com o número de homens. "0 homem médio" não caracteriza
qualquer sentença atômica, ou seja, não nomeia qualquer constituinte da realidade. Pode-se
dizer o mesmo com relação à nação inglesa e a muitas entidades ``metafísicas" que
aparentemente têm suscitado problemas filosóficos. Wittgenstein foi menos específico que
Russell, e certamente menos específicos que os positivistas lógicos, para que, não obstante, o
Tractatus proporcionou todo um sistema de argumentação filosófica, no que se refere a que
fatos são atômicos e que fatos não o são. Ele pretendia enunciar claramente a estrutura lógica do
mundo, não se preocupando com seu conteúdo real.
A característica mais importante das sentenças complexas é que os conectivos usados para
construí-las devem ser "veri-funcionais", isto é, devem ser tais que o valor-de-verdade da
sentença complexa seja inteiramente determinado pelos valores de verdade de suas partes.
Trata-se do "princípio da extensionalidade, com o qual já nos deparamos ao discutir Frege e
que, de acordo com Wittgenstein, é uma precondição do pensamento e da análise lógicos. A
lógica ocupa-se apenas da transformação sistemática de valores-de-verdade; por conseguinte,
uma linguagem lógica deve ser transparente aos valores-de-verdade. Deve ser possível perceber
toda operação em termos da transformação da verdade e da falsidade. (A palavra "não" tem o
sentido de transformar a verdade em falsidade e a falsidade em verdade: a palavra "se", o de
tornar falsa uma sentença complexa se o antecedente é verdadeiro e o conseqüente, falso; caso
contrário, ela a torna verdadeira; e assim por diante.)
A noção de linguagem veri-funcional confere exatidão e força à alegação de Wittgenstein de
que há uma distinção real entre sentenças atômicas e não-atômicas. Ele é capaz de dizer não
apenas o que é a distinção, mas, o que é mais importante como somos capazes de compreendê-
la. Não é difícil para uma linguagem veri-funcional explicar de que modo a compreensão de
sentenças atômicas leva à compreensão de todos os complexos infinitos que podem ser
construídos a partir delas. (Essa é outra aplicação de um princípio de Frege que discutimos nas
pp. 247-48.) As condições-de-verdade de uma sentença complexa formada de maneira verifuncional podem ser extraídas imediatamente das condições-de-verdade de suas partes. E, em
conseqüência, se compreendermos as condições-de-verdade das partes, compreenderemos o
todo.
Além disso, Wittgenstein é capaz de proporcionar uma nova e aparentemente clara distinção
entre o necessário e o contingente, o analítico e o sintético, o a priori e o a posteriori. Tais
distinções reduzem-se à distinção entre verdade lógica e contingência. Uma sentença é uma
verdade lógica caso resulte verdadeira através da substituição, pelos termos, dos componentes
"primitivos" nela presentes. (Uma parte primitiva é aquela que não admite qualquer definição
ulterior. ) 0 paradigma de verdade lógica é a "tautologia" veri-funcional. Consideremos a
sentença "p 0o q". A definição de "ou" é: p ou q é falso se tanto p quanto q forem falsos e, em
caso contrário, verdadeiro. A definição de "não" é a seguinte: não-p é verdadeiro se p é falso, e
falso se p é verdadeiro. Isso quer dizer que a sentença "p ou não-p" é sempre verdadeira,
qualquer que seja o valor-de-verdade de "p". Desse modo não importa como substituímos o
termo primitivo "p", pois isso resultará sempre numa sentença verdadeira. As sentenças que assumirem tal forma são portanto, necessariamente verdadeiras, podendo ser consideradas
verdadeiras a priori por qualquer um que compreenda as operações lógicas da linguagem.
Para Wittgenstein, essa teoria da verdade necessária tem como conseqüência o fato de as
verdades necessárias serem vazias: nada dizem porque nada excluem. São compatíveis com
todo estado de coisas. 0 mundo é descrito pela totalidade das proposições atômicas verdadeiras;
estas são verdadeiras, mas, sendo atômicas, poderiam ser falsas, já que nada em sua estrutura
determina seu valor-de-verdade. Outra maneira de dizer isso é que os fatos existem no "espaço
lógica" que define as possibilidades; as sentenças atômicas verdadeiras descrevem o que é real,
enquanto as tautologias refletem propriedades do próprio espaço lógico.
Essa avaliação da linguagem suscita profundos problemas metafísicos. Em primeiro lugar, há o
problema da relação entre sentenças atômicas e fatos atômicos. Wittgenstein chama essa relação
de "figuração", e tal metáfora tem enganado muitos dos que tentam comentá-las. Ele também
diz que a relação não pode ser descrita, mas apenas mostrada; de fato, sua concepção era de que
se deve mostrar o que é mais básico; caso contrário, nunca poderíamos começar a descrição. E
não está claro exatamente o que ele quis dizer com "mostrar". Quiçá a melhor maneira de
compreender essa teoria - às vezes chamada de "teoria figurativa do significado" - seja negar,
para usar uma expressão ulterior de Wittgenstein, que podemos usar a linguagem "para nos
situarmos entre a linguagem e o mundo". Não podemos avaliar com palavras a relação entre um
fato atômico e uma proposição atômica, a não ser usando a proposição cuja verdade estamos
tentando explicar. Não podemos "pensar" no fato atômico sem pensarmos na sentença que o
"figura". Os limites do pensamento são os limites da linguagem. Wittgenstein conclui seu livro
com o lacônico enunciado: "o de que não se pode falar deve-se calar".
Um dos problemas com que a filosofia do Tractatus se depara reside nesse próprio
procedimento. Só as sentenças atômicas, os complexos veri-funcionais e as tautologias são
significativos. Mas que dizer da teoria que afirma isso? Ela não é sentença atômica, nem
complexo; não pretende dizer, como as coisa s são, mas como devem ser. Mas não é uma
tautologia. Então, é sem sentido? Wittgenstein realmente diz "sim", e com esse gesto ousado
aproxima-se da conclusão de sua doutrina, acrescentando que suas proposições devem servir de
escada a ser descartada pelos que por ela subiram.

4. Wittgenstein e a Análise Linguística
0 Tractatus possui um pouco da fascinação da primeira Crítica de Kant, ou seja, a fascinação de
um doutrina que, na medida do possível, luta para descrever os limites do inteligível, somente
para, ao fazê-lo, ser compelida a transcendê-los. Em momento algum Wittgenstein reconhece a
semelhança de seu pensamento com o de Kant, ou, de fato, com o de qualquer outro, exceto o de
Russell, mas a comparação entre os dois filósofos torna-se cada vez mais impressionante, de tal
modo que alguns têm considerado a argumentação de sua obra póstuma, intitulada Investigações
Filosóficas, o complemento final da Dedução transcendental de Kant.
A filosofia posterior de Wittgenstein desenvolveu-se a partir de uma reação à anterior, ou a
determinada interpretação dela extremamente influente. No Tractatus, a metafísica do atomismo
lógico é apresentada quase que sem referência a qualquer teoria específica do conhecimento. A
própria versão de Russell sobre a teoria era decididamente empirista, identificando os "fatos
atômicos" como relativos ao conteúdo imediato da experiência (ou dados sensoriais, como
Russell os chamou). Utilizando o aparato da teoria de Wittgenstein, Russell foi capaz de
reformular uma versão empirista com o espírito cético de Hume, propondo interpretar toda
entidade no mundo que não seja dado sensorial como "construção lógica". Caso de fato,
queiramos, ou não referindo-nos a tabelas referir-nos a construções lógicas a partir de dados
sensoriais, isso é tudo que, de acordo com Russell, podemos pretender. Como ele assinala,
"onde for possível, as construções lógicas devem ser substituídas por entidades inferidas". Desse
modo, a filosofia dá um passo na direção do positivismo lógico pelo qual todas as doutrinas metafísicas, éticas e teológicas são sem sentido, não devido a algum defeito do pensamento
lógico, mas por não poderem ser verificadas. 0 slogan do positivismo - o significado de uma
sentença é seu método de verificação - é tirado do Tractatus, como grande parte do aparato
mediante o qual se buscou livrar o mundo de entidades metafísicas. Mas estava imbuído do
mesmo espirito que Hume, e suas principais teorias eram reformulações das doutrinas humanas
concernentes à causalidade, ao mundo físico e à moralidade, em termos não de uma teoria
"genética" do significado, mas de uma teoria "analítica". A época em que tal programa estava
em andamento, com a obra de Rudolf Carnap (1891-1970) e outros pensadores do chamado
"Círculo de Viena" (ver especialmente a obra de Carnap intitulada Estrutura Lógica do Mundo,
1928), Wittgenstein renunciou totalmente ao atomismo e seus resultados, parou de publicar e
iniciou uma existência hermética e nômade, a que assegurou, até sua morte, que sua influência
se exercesse apenas sobre os que tiveram o privilégio de conhecê-lo pessoalmente ou que
chegaram a ver os manuscritos que ele ocasionalmente nos mostrou. 0 mais famoso desses
manuscritos - Os cadernos azuis e marrons - chegou a Oxford na década de 1940, precipitando a
escola de "análise lingüística", para a qual J. L. Austin (1911-60) e Gilbert Ryle ( 1900-1977 ) já
tinham preparado o terreno. No entanto, não discutirei essa escola, composta por tantas e tão
inexpressivas figuras que se caracteriza menos por abraçar qualquer doutrina que por ter-se
recusado a apoiar alguma delas. Nem tecerei considerações sobre o desenvolvimento ulterior do
positivismo lógico na América, onde realizou um casamento prolífico - através de Nelson
Goodman e Willard von Orman Quine, alunos de Carnap - com o "pragmatismo" local de C. S.
Peirce (1839-1914), William James (1842-1910) e C. I. Lewis (1883-1964). Ao contrário,
concluirei este Livro com um esboço de certas doutrinas expressas em Investigações filosóficas
(1953), As observações sobre os fundamentos da matemática (I956) e outras obras. Em virtude
do fato de se relacionarem diretamente com a história da filosofia tal como a tenho descrito até
aqui, essas doutrinas propiciarão alguma indicação, ainda que superficial, de até que ponto a
filosofia posterior de Wittgenstein tem transformado e até mesmo destruído a tradição de
investigação intelectual iniciada com Descartes.

5. O Segundo Wittgenstein
A ênfase da filosofia posterior de Wittgenstein é decididamente antropocêntrica. Embora ainda
estivesse centrada em questões concernentes ao significado e aos limites do proferimento
significante, seu ponto de partida se tornaram, não as imutáveis abstrações de um ideal lógico,
mas os esforços falíveis da comunicação humana. Ao mesmo tempo, o elemento humano não
seguiu a via usual da epistemologia, mas um caminho totalmente surpreendente. Wittgenstein o
introduz por meio de reflexões a priori sobre a natureza da mente humana e sobre o
comportamento social que dota essa mente de sua estrutura característica. O que é "dado" não
são os "dados sensoriais" dos positivistas, mas as "formas de vida" da antropologia filosófica
kantiana. Isso quer dizer que o objeto de qualquer teoria do significado e do entendimento é a
prática pública do proferimento e tudo que torna tal prática possível. Assim sendo, Wittgenstein
inicia suas investigações ulteriores sobre a natureza da linguagem no ponto em que Frege parou.
Ele aceita a tese do "caráter público" do sentido que já levara Frege a rejeitar as teorias
empiristas tradicionais do significado. Isso resultou não apenas em nova avaliação da natureza
da linguagem, mas também numa revolucionária filosofia da mente. Os problemas metafísicos
que Kant, Hegel e Schopenhauer tentaram resolver são re-expressos como dificuldades na
interpretação da consciência. Assim entendidos, repentinamente se afiguraram capazes de serem
resolvidos.
A perspectiva social levou Wittgenstein a afastar-se da ênfase fregeana no conceito de verdade
ou a considerar que tal ênfase reflete uma exigência mais fundamental, isto é, a de que o
proferimento humano seja responsável por um padrão de correção. Tal padrão não é dado por
Deus, nem jaz oculto na ordem natural, sendo um artefato humano, que tanto produz as práticas
lingüísticas que o regem quanto é por elas produzido. Isso não quer dizer que um indivíduo
pode decidir por si mesmo o que é certo e o que é errado na arte da comunicação. Ao contrário,
o constrangimento da publicidade refreia não somente cada um de nós, mas também todos nós; além disso, tal constrangimento está intimamente vinculado à concepção que fazemos de nós
mesmos como seres que observam um mundo independente e nele agem. Todavia, é verdade
que o único constrangimento envolvido no uso comum é o próprio uso. Se nos opomos a
verdades que nos parecem necessárias, tal se dá apenas porque fomos nós que criamos as regras
que as fazem ser assim; e também podemos abrir mão daquilo que criamos. A compulsão que
experimentamos na inferência lógica, por exemplo, não é compulsão, independentemente de
nossa disposição para experimentá-la.
Esse tipo de reflexão levou Wittgenstein a uma forma muito sofisticada de nominalismo: uma
negação que podemos localizar fora da prática lingüística para a coisa que a rege. Os fatos
últimos são linguagem e as formas de vida que se desenvolvem a partir da linguagem e a tornam
possível. O nominalismo não é recente, nem lhe têm faltado representantes em nossa época.
Nelson Goodman (nascido em 1906), por exemplo, tem defendidas, utilizando argumentos que
geralmente se assemelham aos de 'Wittgenstein, uma espécie de nominalismo que incorpora
toda uma filosofia da ciência a uma teoria do conhecimento. O que caracteriza Wittgenstein é a
transição que ele realiza no plano da articulação da filosofia da linguagem com a filosofia da
mente. Ao realizar tal transição, tenta subverter a principal premissa de quase toda a filosofia
ocidental desde Descartes - a premissa da "prioridade do caso da primeira pessoa".
Wittgenstein usa vários argumentos destinados a mostrar o que essa premissa realmente
significa e, ao fazê-lo, tenta demonstrar sua insustentabilidade. Ao serem reunidos, esses
argumentos proporcionam o que pode ser descrito como uma "figuração" da consciência
humana. Tal figuração possui muitos aspectos; alguns são metafísicos, outros, epistemológicos.
Ela envolve a rejeição da busca cartesiana da certeza, o aniquilamento da concepção de que os
eventos mentais são episódios privados que só podem ser observados pela própria pessoa e a
recusa de todas as tentativas de compreender a mente humana isoladamente das práticas sociais
por meio das quais ela encontra expressão. Nesta obra, é impossível apresentar todas as
considerações com que Wittgenstein sustenta ``a prioridade do caso da terceira pessoa".
Portanto, mencionarei apenas um ou outro item central da referida argumentação, extraindo
algumas conclusões com relação à importância histórica e filosófica da tese.

6. O Argumento da Linguagem Privada
O mais famoso argumento desenvolvido pela posição wittgensteiniana é o que veio a ser
conhecido como "o argumento da linguagem privada". Ele ocorre em diversas versões das
Investigações Filosóficas e tem sido objeto de muitos comentários. Parece-me que, em resumo,
o argumento é o seguinte: há um "privilégio" peculiar ou "imediatidade" envolvidos no
conhecimento das nossas próprias experiências atuais. Em certo sentido, é absurdo sugerir que
tenho de ou poderia descobrir estar equivocado a respeito delas no curso normal das coisas.
(Esse é o pensamento que também subjaz a tese kantiana da "Unidade Transcendental da
Apercepção", ver pp. 141-42. ) Isso tem resultado no que podemos chamar de "ilusão da
primeira pessoa". Posso ter mais certeza de meus estados mentais que dos seus. Isso só ocorre
porque observo diretamente meus estados mentais e, os seus, indiretamente. Quando vejo você
sentir dor, vejo o comportamento físico, suas causas, determinado estado complexo de um
organismo. Mas isso não é a dor que você sente, apenas algo que a acompanha de modo
contingente. A própria dor está oculta por sua expressão, só podendo ser diretamente observada
por aquele que a sofre.
Essa é, em suma, a teoria cartesiana do espírito, apresentada como explicação do caso da
primeira pessoa. Wittgenstein alega que tanto a teoria quanto aquilo que ela deve explicar são
ilusões. Suponhamos que a teoria fosse verdadeira. Wittgenstein afirma que, então, não nos
poderíamos referir a nossas sensações por meio de palavras inteligíveis numa linguagem
pública. Pois as palavras, numa linguagem pública, adquirem seu sentido publicamente, ao
serem associadas a condições publicamente acessíveis que asseguram sua aplicação. Tais
condições determinarão não somente seu sentido, mas também sua referência. Wittgenstein alega que a suposição de que essa referência seja privada (no sentido de, em princípio, só poder
ser observada pela própria pessoa) é incompatível com a hipótese de que o sentido é público.
Por conseguinte, se os eventos mentais são como Descartes os descreve, nenhuma palavra em
nossa linguagem pública poderia realmente referir-se a eles.
Contudo, realmente os cartesianos e sua progênie empirista têm sempre, intencionalmente ou
não, aceito essa conclusão e escrito como se cada um de nós descrevesse nossas sensações ~
outros episódios mentais atuais numa linguagem que, em virtude de seu campo de referência
ser, em princípio, inacessível a outros, só é inteligível para quem a usa. Wittgenstein opõe-se à
possibilidade de tal linguagem privada. Tenta provar que não pode haver diferença, para quem
fala essa linguagem, entre como as coisas lhe parecem e como elas são, pois ele perderia a
distinção entre ser e parecer. Entretanto, isso significa perder a idéia de referência objetiva. Na
realidade, não se visa de maneira alguma a linguagem; ao contrário, ela torna-se um jogo
arbitrário. O que parece certo é o que é certo; conseqüentemente, não se pode mais falar do
certo.
Isso leva a seguinte conclusão: não podemos referir-nos aos eventos mentais cartesianos
(objetos particulares) numa linguagem pública, nem nos referir a eles numa linguagem privada.
Em conseqüência, não podemos referir-nos a eles. No entanto, seria possível dizer que eles, não
obstante, podem existir! Wittgenstein opõe-se a tal possibilidade de um modo que faz lembrar o
ataque kantiano ao noumena, dizendo que um nada desempenhará a mesma função que um algo
sobre o qual nada se possa dizer. Ademais, podemos referir-nos a sensações; desse modo, o que
quer que sejam, as sensações não são eventos mentais cartesianos.
Wittgenstein faz acompanhar esse argumento de uma penetrante descrição, a partir do ponto de
vista da terceira pessoa, de muitos fenômenos mentais complexos – particularmente, os da
percepção, intenção, expectativa e desejo. E, como ele reconhece, seus argumentos, se bemsucedidos, refutam a possibilidade de uma "fenomenologia pura", visto que implicam que nada
se pode aprender sobre a essência do mental ou sobre a essência de qualquer coisa com o estudo
(em isolamento cartesiano) apenas cia primeira pessoa. A "imediatidade" do caso da primeira
pessoa é unicamente um indício de sua superficialidade. De fato, conheço meus próprios estados
mentais sem observar meu comportamento; mas isso não se deve ao fato de eu estar observando
algo mais. É simplesmente uma ilusão, suscitada pela autoconsciência, de que a autoridade
necessária que acompanha o uso público do "eu" é uma autoridade sobre alguma coisa da qual
só o "eu" possui conhecimento.

7. A prioridade da terceira pessoa
Apesar de ter rejeitado assim o "método" da fenomenologia, Wittgenstein manifestou, contudo,
simpatia para com uma postura teórica que se torna - mediante uma série de acidentes históricos
- aliada deste método. Pensadores como o kantiano Dilthey (ver p. 259) buscaram os
fundamentos de uma compreensão peculiarmente "humana", pela qual o mundo seria
considerado, não cientificamente, mas sob o aspecto do "significado". Como alguns
fenomenologistas, tais como Merleau-Ponty e Sartre, Wittgenstein argumentou que percebemos
e compreendemos o comportamento humano de maneira diferente daquela pela qual
percebemos e compreendemos o mundo natural. Explicamos o comportamento humano
apresentando razões e não causas. Dirigimo-nos ao nosso futuro tomando decisões e não
fazendo predições. Compreendemos o passado e o presente da humanidade por meio de nossos
objetivos, emoções e atividade, e não mediante teorias preditivas. Todas essas distinções
parecem suscitar a idéia;, se não de um mundo especificamente humano, pelo menos de um
modo especificamente humano de conceber as coisas. Grande parte da filosofia posterior de
Wittgenstein volta-se para a tarefa de descrever e analisar as características do entendimento
humano, bem como de aniquilar o que ele considerou a vulgar ilusão de que a ciência poderia
produzir uma descrição de todas essas coisas com as quais nossa humanidade (ou, para falar de
maneira mais filosófica, nossa existência como agentes racionais) está mesclada. Ele defende não somente a posição de que nosso conhecimento de nossas próprias mentes pressupõe o
conhecimento das mentes de outros, mas também a de que – como assinala o fenomenologista
Max Scheler (1874-1928) – "a convicção que temos da existência das mentes de outros é
anterior e mais profunda que nassa crença na existência da natureza". Em outras palavras,
apesar de ter atacado o método e a metafísica da fenomenologia, Wittgenstein compartilha com
os fenomenologistas o sentido de que há um mistério nas coisas humanas que não será revelado
pela investigação científica. Tal mistério não é dissipado pela explicação, mas apenas pela
cuidadosa descrição filosófica do "dado". Para Wittgenstein, a diferença reside no fato de que o
que é "dado" não é o conteúdo da experiência imediata, mas as formas de vida que tornam
possível a experiência.
A destruição da ilusão da primeira pessoa tem duas conseqüências. Em primeiro lugar, não
podemos iniciar nossas investigações a partir do caso da primeira pessoa e pensar que ela nos
proporciona um paradigma de certeza. Pois, considerada isoladamente, ela nada nos
proporciona. Em segundo lugar, embora a distinção entre ser e parecer não exista para mim no
momento em que contemplo minhas próprias sensações, isso só ocorre porque falo uma
linguagem pública que determina essa propriedade peculiar do conhecimento da primeira
pessoa. O colapso do ser e parecer é um caso "degenerado". Assim sendo, posso saber que, se
esse colapso é possível, é porque há outras pessoas no mundo além de mim e porque tenho em
comum com elas uma natureza e uma forma de vida. De fato, habito um mundo objetivo em que
as coisas são ou podem ser diferentes do que parecem. Desse modo, de maneira surpreendente,
o argumento da Dedução Transcendental de Kant acaba fundamentado. A precondição do
autoconhecimento (da Unidade Transcendental da Apercepção) é, afinal de contas, o
conhecimento dos outros e do mundo objetivo que os contém.
Muita coisa mudou na filosofia desde que Wittgenstein produziu seus argumentos, e muita coisa
não mudou. Entretanto, de uma coisa se pode ter certeza. A suposição de que existe a certeza da
primeira pessoa, que proporciona um ponto de partida para a investigação filosófica e que levou
ao racionalismo de Descartes e ao empirismo de Hume, bem como a grande parte da
epistemologia e da metafísica modernas, foi finalmente deslocada do centro da filosofia. A
ambição de Kant e Hegel de obter uma filosofia que remova o "eu" [self ] do limiar do
conhecimento; de modo a finalmente transformá-la numa forma enriquecida acabada, talvez
tenha sido agora realizada.
© Roger Scruton, filósofo inglês e escritor.

Observação.
Texto cedido ao Centro de Estudos em Filosofia Americana para tradução e divulgação. Para cópia e
divulgação, basta informar a propriedade do CEFA, a fonte e o tradutor. Pedimos a gentileza de
comunicar ao CEFA a utilização do texto: Fran: fghi29@yahoo.com.br